São Paulo, sábado, 1 de junho de 1996
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A austeridade para os outros

EDUARDO MATARAZZO SUPLICY

O governo Fernando Henrique Cardoso conclama todos à austeridade. Quando os representantes dos trabalhadores sem terra ou dos agricultores solicitam mais recursos para que se expandam as metas de assentamento e de financiamento, restrições pela falta de recursos suficientes são colocadas.
Quando os servidores públicos solicitam que lhes seja assegurado o reajuste de remuneração que resguarde, pelo menos, o seu poder aquisitivo, em intervalos não superiores a 12 meses (agora já se vão 17 meses sem ajuste), os ministros ponderam que não há de onde tirar recursos e que já houve ajuste real significativo em 95.
Quando o Tribunal de Contas da União aponta que os programas de política social gastaram significativamente menos em 1995 do que em 1994, novamente a justificativa corresponde à necessidade premente de economizar recursos públicos para se aproximar do equilíbrio fiscal e garantir a maior estabilidade da moeda. Quando se reclama que o ajuste no salário mínimo, de R$ 100 para R$ 112, não correspondeu ao aumento no custo de vida, da ordem de 20%, nem levou em conta o aumento do PIB "per capita", ponderou o governo que 12% era o máximo que os cofres públicos poderiam suportar.
Seria de se esperar que o governo tivesse atitudes consistentes e desse exemplos em todas as suas ações. Levar uma comitiva de cem pessoas para a França com as despesas pagas pelo Tesouro, segundo informa a imprensa, constitui clara contradição à alegada postura de austeridade que é levantada diante das reivindicações prementes da sociedade brasileira.
O ministro Luiz Felipe Lampreia justificou o tamanho da comitiva com o argumento de que o presidente Bill Clinton viaja com comitivas bem maiores. Só não disse que os EUA têm um PIB dez vezes maior e uma renda "per capita" oito vezes maior que a nossa.
A propósito, o presidente Clinton acaba de convencer a Câmara dos Deputados a aprovar o aumento do salário mínimo de US$ 4,25/hora para US$ 4,75, a partir de julho, e, em julho de 1997, US$ 5,15. Para garantir melhor remuneração aos trabalhadores nas faixas de menor renda, Clinton ampliou o "Crédito Fiscal por Remuneração Recebida", que garante um complemento de renda a todos que trabalham para que alcancem o suficiente para não viver abaixo da linha da pobreza.
Espero que pelo menos o presidente tenha se preocupado em saber como fazem os franceses para que ninguém viva em condições de miséria.

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