São Paulo, domingo, 2 de junho de 1996
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Peruanos engrossam eleitorado do AM

ANDRÉ MUGGIATI
DA AGÊNCIA FOLHA

O voto ilegal de peruanos pode estar determinando o resultado de eleições brasileiras em cidades da fronteira com o Peru e a Colômbia.
Um relatório do Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas ao Ministério Público afirma que o voto de peruanos é decisivo em Benjamin Constant (AM), Tabatinga (AM), Atalaia do Norte (AM), Santo Antônio do Içá (AM) e outros municípios fronteiriços.
A suspeita da fraude fez com que o tribunal instaurasse uma investigação em Benjamin Constant e Tabatinga no final do ano passado.
A apuração confirmou a existência da fraude. A estimativa é de que 233 dos cerca de 10 mil eleitores de Benjamin Constant e 372 dos cerca de 10 mil eleitores de Tabatinga sejam estrangeiros.
O número de votos é suficiente para eleger um vereador nestes municípios. Em 1992, o eleito menos votado de Benjamin Constant teve 132 votos e, em Tabatinga, 131.
Duas testemunhas
Os peruanos tiram o título de eleitor apresentando uma certidão de nascimento brasileira. Para tirar o falso atestado, basta apresentar duas testemunhas que digam que a pessoa nasceu no Brasil.
Quando moram no Brasil, os peruanos tiram a falsa certidão de nascimento e demais documentos com o objetivo de regularizar a situação no país. Durante a investigação, foram identificados vários peruanos que possuem certidão de nascimento brasileira.
O promotor de Tabatinga, Luiz Tadeu Calderoni, entretanto, acredita que políticos locais montaram esquemas para trazer peruanos para votar no Brasil com documentos falsos.
O administrador da cidade de Islandia, no Peru, Mario Rivera Pereyra, corrobora dessa desconfiança. Ele afirma que a maioria da população de sua cidade, de 2.000 habitantes, possui documentos peruanos e brasileiros.
Títulos cancelados
Como resultado das investigações, foram iniciados processos que concluíram até agora pelo cancelamento de apenas três falsos títulos eleitorais de peruanos.
Foi enviada também uma cópia dos trabalhos para que o Ministério Público tome providências, instaurando um processo criminal e apurando as responsabilidades de quem emitiu as falsas certidões.
O promotor Calderoni diz, porém, que é muito difícil acabar com os falsos eleitores. "Como podemos saber se uma pessoa nasceu do lado de lá ou de cá da fronteira?", pergunta.
Para o juiz de Benjamin Constant, Roberto Aragão Filho, "certamente aconteceu um desleixo por parte do escrivão do cartório de registro civil".
O escrivão envolvido nas irregularidades morreu no ano passado.
Sotaque suspeito
Aragão Filho afirmou que desde 1995 se realiza um recadastramento eleitoral para se resolver o problema. Caso haja dúvida durante o recadastramento, o escrivão encaminha o processo ao juiz.
O juiz pede, então, que seja aberto um processo de justificação, no qual a pessoa tem de provar que é brasileira. O sotaque do eleitor é determinante para a iniciativa.
Mas, segundo Aragão Filho, o recadastramento tem se mostrado ineficiente, pois "em apenas dois ou três casos surgiu a dúvida de que não fossem brasileiros".
"Eles têm testemunhas, comprovantes de residência e inúmeros parentes no Brasil", disse.
Os peruanos também costumam ser casados com brasileiras e têm filhos no país. Isto lhes garante a permanência em solo brasileiro e permitiria entrar com um processo de naturalização, que garantiria, inclusive, o direito de votar em outubro.

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