São Paulo, segunda-feira, 3 de junho de 1996
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Acordo PPB-PFL é arranjo impublicável, diz Montoro

GABRIELA WOLTHERS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ex-governador de São Paulo Franco Montoro (1983-1987) considera as eleições municipais deste ano um teste para "distinguir bem" as posições "fundamentalmente diferentes" de PSDB e PFL.
Hoje deputado federal, Montoro, 79, marcou seu retorno à política nacional ao desempenhar papel decisivo na articulação que convenceu José Serra a disputar a prefeitura paulistana.
Nesta entrevista, Montoro revela como derrubou a resistência do então ministro do Planejamento.

Folha - Como o senhor convenceu Serra a disputar a prefeitura?
Franco Montoro - Coloquei o problema da sucessão municipal em termos mais altos. Em primeiro lugar, a importância de vencer a eleição na maior cidade do país.
O segundo ponto colocado foi o conceito de política em termos de serviço público e não de interesse pessoal e, portanto, a responsabilidade social de uma decisão.
Em terceiro, afirmei que a recusa à candidatura representaria um desaponto e um não-atendimento de uma exigência, uma reivindicação que vinha das bases do PSDB.
A candidatura foi colocada nos termos de convocação e de dever. Tínhamos que jogar com os melhores quadros do partido.
Folha - Chegou a ser colocado que uma recusa de Serra agora poderia fechar as portas do partido para futuras candidaturas dele?
Montoro - Foi dito que o desaponto do partido poderia trazer como consequência uma dificuldade para futuros pleitos.
Mas o argumento mais importante foi que ele tem todas as condições para ganhar. Foi dito que, se ele perdesse, teria milhões de votos e estaria naturalmente pré-lançado candidato a governador.
Folha - O que o sr. quis dizer quando afirmou que quis colocar a sucessão em termos "mais altos"?
Montoro - O jogo político fica muito nas considerações menores de vantagens pessoais ou partidárias. O importante é colocar num plano mais elevado a discussão. Preferi colocá-la no atendimento de uma reivindicação da população, esse é o dever do político.
Folha - Pensei que o sr. estava se referindo à coligação do PFL com o PPB...
Montoro - Digamos que o arranjo feito entre o PFL e o PPB em São Paulo não é um acordo publicável. Mas não gostaria de falar sobre isso.
Folha - Mas a candidatura Serra foi, em certa medida, uma resposta à coligação?
Montoro - Foi seguramente uma resposta, é claro. Tudo indicava que o PFL acompanharia nossa indicação. A decisão do PFL de apoiar o PPB precipitou uma tomada de decisão do PSDB.
O PSDB tem todas as condições de lançar sozinho um candidato. É claro que estamos abertos a entendimentos com quaisquer partidos.
Folha - PSDB e PFL serão adversários nas campanhas das principais cidades, como São Paulo e Rio. Esse quadro pode trazer consequências no âmbito federal?
Montoro - Acho que contribuirá no sentido de se distinguir bem as posições, o que não impede que se mantenha um entendimento no governo federal para a execução de um programa definido na campanha de Fernando Henrique.
Folha - O PSDB considera importante essa distinção?
Montoro - Essa distinção é importante para deixar claro que somos partidos com posições fundamentalmente diferentes. Isso é claro. E é bom que a opinião pública perceba essa distinção, o que não impede que haja entendimento entre os dois partidos.
O PFL tem como programa o liberalismo -o livre mercado- e o PSDB tem como fundamento o social, a solidariedade. O PSDB não tem como base nem a indiferença liberal nem a agitação e a luta de classes.
Folha - Então, apesar das diferenças, o sr. considera que o acirramento das disputas municipais não deve levar a um distanciamento entre os dois partidos?
Montoro - A posição do PSDB pela linha social e de solidariedade vai ficar mais marcada com essas candidaturas. Mas isso é um acidente. A questão é municipal e nada impede que haja entendimento entre os dois partidos no governo federal. A aliança se faz entre partidos diferentes, isso é normal.
Folha - Mas o governo FHC está sendo apontado mais como liberal do que "solidário". Pode haver uma reviravolta?
Montoro - Não é justa esta afirmação. O governo FHC, ao contrário do que se diz, tem feito reformas sociais da maior importância. O Plano Real não é só um plano econômico, é um plano de significação social.
Com a estabilidade, ele deslocou milhões de reais para a classe trabalhadora, pois foi eliminado o imposto inflacionário.
Por outro lado, no plano da educação, o ministro Paulo Renato Souza está realizando um trabalho de descentralização da merenda e do livro escolar, assegurando uma remuneração para os professores, todos estes programas com uma grande significação social.
Fala-se muito no desemprego. O desemprego é um fenômeno mundial. E estamos tentando combater com programas como o incentivo à agricultura familiar. Mas isto não tem divulgação.
Folha - Pelo visto, o sr. concorda com a tese de que está havendo problemas de comunicação...
Montoro - Concordo. E depois, é um vício criticar. Na França, Fernando Henrique realizou entendimentos da maior importância. As ligações que estão sendo feitas com a França nos libertam de uma dependência com relação aos EUA. Mas o que sai nos jornais é o fato de ele ter levado o neto para a viagem. São coisas pequenas.
Folha - Vários políticos tucanos que hoje têm expressão nacional participaram de seu governo em São Paulo. O sr. se considera um conselheiro de todos?
Montoro - Com a nomeação do Antonio Kandir, já são oito ministros que ocuparam ou ocupam postos no governo FHC. Isso me gratifica e até me emociona. Foi uma semente que lançamos, de descentralização e de democracia.
Folha - Já que Serra foi um desses políticos, qual o conselho o sr. daria para a campanha municipal?
Montoro - São Paulo não é uma cidade. É um conjunto de cidades. O fundamental é a divisão em subprefeituras e a criação, em cada uma delas, de um conselho com representantes da população.
Serra também dará ênfase à criação de emprego. A pequena empresa tem que ser estimulada, assim como a agricultura familiar, cooperativas e turismo.
Será dada prioridade para a construção de habitações, uma fonte multiplicadora de empregos. Por fim, dar prioridade à educação para o trabalho e aos cursos profissionalizantes.

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