São Paulo, segunda-feira, 3 de junho de 1996
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Os argumentos pró-Real

LUÍS NASSIF

Há tempos o secretário de Política Econômica, José Roberto Mendonça de Barros, tem se constituído no porta-voz de maior credibilidade do governo no front das expectativas econômicas.
Tem a seu favor raciocínio lógico, ausência de mistificações e a capacidade de admitir erros e reconhecer problemas.
Admite que a política de juros adotada no ano passado produziu um terremoto na economia, mas sustenta que, mesmo assim, o Real está sob controle.
Seus argumentos:

Exportações: A variável chave do Real é o comportamento das exportações.
Sem a recuperação das exportações, haverá a necessidade de manter juros apertados para inibir as importações, via redução da atividade econômica.
Essa política, por sua vez, compromete o ajuste fiscal, ao aumentar a dívida interna e reduzir a arrecadação, pela queda da atividade.
Depois do choque cambial, houve um arrefecimento nas exportações de manufaturados, diz ele.
Depois do susto, as empresas teriam se envolvido em processos profundos de reestruturação, que já estariam se refletindo nas exportações de manufaturados -que nos últimos meses cresceram 10% em quantidade e preço.

"Custo Brasil"
A manutenção desse ritmo estaria garantida pelos avanços das ações que compõem o chamado "custo Brasil", a partir das seguintes iniciativas:
1) A privatização da malha oeste da Rede Ferroviária Federal (a chamada ferrovia da morte) significou uma virada essencial no processo de privatização de serviços públicos. Pela primeira vez participou do evento uma operadora de primeira linha dos Estados Unidos.
A notícia mereceu primeira página do "Financial Times", por significar o início efetivo da entrada no país de operadoras externas, ponto essencial para melhorar o preço e a qualidade da privatização brasileira.
2) Depois de dois anos parados, os portos começam a se movimentar. A regulamentação do Órgão Gestor de Mão-de-Obra começa a fazer efeito e os investimentos privados ganham velocidade. Apenas no Porto de Santos (SP) já existem cinco projetos acertados, que implicarão investimentos da ordem de US$ 250 milhões.
3) Já se registra recuperação em muitos setores exportadores. A indústria de calçados do Sul recuperou sua capacidade exportadora, inclusive para os Estados Unidos.
Quando estourou a crise mexicana -lembra José Roberto- as exportações estavam crescendo a 2% ao ano, e as importações, a 25%.
Aqui, mesmo discutindo-se se haverá superávit de US$ 1 bilhão ou déficit de US$ 2 bilhões, a situação está sob controle, porque as reservas cambiais garantem a travessia.

Déficit público: O resultado operacional deste ano se situará na faixa dos 3% (parte fiscal). Além disso, caminham bem os ajustes nos Estados e nas estatais.
Fora o fato de o STF ter tomado uma decisão histórica, do ponto de vista das contas públicas: ter acabado com a data-base do funcionalismo como norma legal.
Além disso, a privatização permitirá expressivos ganhos, não tanto pelo valor obtido nas vendas, mas pela vedação de rombos anuais.
Mas, a partir do ano seguinte ao da privatização, haverá reflexos expressivos, tanto na redução dos rombos, como no aumento dos pagamentos de tributos.
Inflação: Mesmo com a sazonalidade, praticamente todas as instituições estão trabalhando com inflação mensal da ordem de 1% a 1,5%. Além disso, a desinflação das commodities reduziu eventuais pressões agrícolas.

Atividade: O grosso da agricultura está indo para o ajuste. Persistem problemas apenas em algumas áreas do Rio Grande, afetadas pela seca, com grandes devedores.

Crédito: O crédito ao consumidor tem experimentado reação consistente, embora lenta. Pela primeira vez, a Serasa (Centralização de Serviços dos Bancos) mostrou redução da inadimplência de pessoa física. Também caiu a inadimplência entre setores industriais. Persiste o "empoçamento" no crédito bancário, sobre o qual o BC tem que atuar.

Previdência: Esse é o nó. O órgão já zerou seu resultado de caixa. A previsão é de rombo de US$ 3 bilhões neste ano, mas crescendo exponencialmente.

Capital: Nos próximos meses, o governo deverá empreender um conjunto de ações visando resolver a questão do crédito e a do investimento. Será tema da próxima coluna.
A coluna registra os argumentos e guarda para o fim seus comentários.

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