São Paulo, terça-feira, 4 de junho de 1996
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A reviravolta no crédito

LUÍS NASSIF

Após os desastres perpetrados pela política monetária, o grande desafio da política econômica atual será preparar o terreno para o relançamento da economia.
O ponto central dessa estratégia será a reorganização da poupança interna e externa, de maneira a irrigar o setor produtivo, principalmente neste momento em que as taxas de juro amalucadas direcionaram novamente a poupança para financiar a explosão do déficit público.
O secretário de Política Econômica, José Roberto Mendonça de Barros, informa que está no forno um elenco expressivo de projetos, que deverão ser desovados nos próximos meses.
O que se pretende é uma reviravolta no sistema de financiamentos, utilizando-se dos modernos mecanismos financeiros de securitização de recebíveis.
Na área do crédito para médias empresas, a última grande inovação foi o velho borderô de duplicatas -a empresa toma empréstimos dando como garantia duplicatas a receber.
Não-bancários No novo modelo, privilegiam-se instrumentos não-bancários. Com base em recebíveis, ou em previsão de faturamento, a empresa emite títulos e os desconta junto a investidores institucionais.
Há pelo menos quatro iniciativas nesse sentido:
1) Relançamento dos "commercial papers".
São papéis pré-fixados, emitidos com lastro nas previsões de faturamento das empresas. Com inflação alta, seu prazo de emissão era mensal. Em cada emissão havia a necessidade de pagar taxas à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), encarecendo a captação.
Com prazos mais longos, e sem pagar IOF, os papéis ganharão atratividade. Deverão ser adquiridos por seguradoras, fundos de pensão e FIFs.
2) Securitização de recebíveis.
Hoje é prática proibida. Pretende-se autorizá-la para cartões de crédito e passagens aéreas, dentro dos mesmos princípios do "commercial paper". Com isso, retira as grandes empresas do mercado de crédito convencional, deixando espaço para as pequenas e médias.
3) Mercado de hipotecas.
Há tempos as entidades do setor imobiliário já possuem um projeto de criação de uma agência de securitização, capaz de substituir o antigo Sistema Financeiro da Habitação. Lança-se o empreendimento e, com base nos contratos vendidos, desconta-se o papel nessa agência.
4) Ainda está em fase de desenho, dada a sua complexidade, um novo papel, para médias empresas que se disponham a abrir seu capital, que permitirá captar recursos no mercado de euromoedas.
José Roberto acha que, com esses quatro produtos, será possível sair mais depressa da armadilha do empoçamento de crédito no sistema bancário.
Se o governo conseguir operacionalizar rapidamente essas propostas, de fato poderá ocorrer uma reviravolta no mercado de crédito, diluindo um pouco os efeitos perniciosos da política monetária.
Chico ilógico
Em entrevista ao colunista Celso Pinto, o diretor do Banco Central Chico Lopes sustentou que a redução do compulsório não reduziria a taxa de juros dos empréstimos, pois o nível das taxas é dado pelos bancos de investimento. Por essa visão, a medida serviria apenas para aumentar os "spreads" bancários, sem desafogar os devedores.
Desde os primórdios da reforma bancária, nunca se soube que bancos de investimentos tivessem participação expressiva no mercado de capital de giro. E se aumento de oferta não reduz preços, o que Lopes sugere: tabelamento ou novena?
O que surpreende é que o nível absurdo das taxas seja sustentado pelo presidente da República com base em argumentos desse nível.

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