São Paulo, domingo, 9 de junho de 1996
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Saúde ignora idosos, afirmam médicos

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Estudos na Europa e EUA mostram que os idosos consomem de três a quatro vezes mais em saúde que as pessoas de outras faixas etárias. A permanência nas internações é duas vezes mais longa.
Projetada para um Brasil em via de envelhecimento, essa relação indica que já não há dinheiro, médicos e leitos suficientes para os cerca de 7,5 milhões de homens e mulheres acima dos 65 anos. No ano 2000, eles serão 8,6 milhões.
"Nada está sendo feito diante do envelhecimento da população", diz Ricardo Shoiti Komatsu, presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia da seção Estado de São Paulo.
"Só há dez vagas de residência médica em geriatria em todo o país", diz Maria do Carmo Sitta, geriatra do Hospital das Clínicas.
"Não há dinheiro suficiente para tratar de forma adequada as múltiplas enfermidades que acometem os idosos", afirma o médico Renato Veras, 46, fundador e diretor da Universidade Aberta da Terceira Idade da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro).
Segundo ele, enquanto os EUA vêm destinando fundos para os idosos desde os anos 30, só agora o Brasil está despertando para o problema. "Nosso sistema de saúde é totalmente equivocado", diz. "O idoso entra pelo hospital e vai acabar no asilo. É o pior caminho."
Prevenção de doenças
Veras defende um modelo de prevenção com equipes treinadas que visitem as famílias para detectar as doenças antes de seu surgimento. Desta forma, se conseguirá adiar o agravamento das doenças.
Komatsu, da sociedade de geriatria, diz que "a tragédia do Rio reflete o falência do sistema de saúde". "As vítimas são os mais frágeis, as crianças e os idosos."
Segundo ele, o Brasil precisa desenvolver uma "cidadania do envelhecimento", como a que existe nos países mais velhos.
Aqui, ainda prevalecem o medo de ficar velho, o preconceito contra os idosos e a ignorância de seus problemas. Só as doenças que se manifestam com dores são cuidadas. A depressão, que atinge muitos idosos, é ignorada. Menos da metade dos portadores de algum tipo de demência são localizados ou procuram os serviços de saúde.
"Só vemos a ponta do iceberg", afirma Komatsu. "Uma grande multidão de idosos com alguma doença pode estar encerrada em suas casas sem tratamento."
Epidemiologia
A epidemiologia é inexorável com idosos. Doenças se agravam e se multiplicam de forma irreversível à medida que os anos passam.
Acima dos 65 anos dobra o risco de doenças coronarianas, de derrames e mal de Parkinson. A incidência de câncer é dez vezes maior; 50% das pessoas sofrem de hipertensão; 40% de reumatismo; o alcoolismo atinge 43% dos homens.
Depois dos 75 anos, 20% desenvolvem diabetes, 18% sofrem de algum tipo de demência.
A lista de doenças -feita a partir de estatísticas norte-americanas- segue pela depressão, obesidade, incontinência urinária, osteoporose, diminuição da capacidade visual e auditiva.
"A doença certamente se iniciou bem antes e poderia ter sido diagnosticada e tratada", diz Maria do Carmo Sitta, 34, geriatra do HC.
Segundo ela, "não há como barrar o processo de envelhecimento, mas é possível envelhecer com saúde e qualidade de vida".
A receita é conhecida: detecção precoce e tratamento das doenças, dieta balanceada e combate ao sedentarismo.
"O exercício físico é a única 'fonte da juventude', pois preserva a capacidade funcional dos órgãos", diz Maria do Carmo.

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