São Paulo, segunda-feira, 10 de junho de 1996
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Terceiro setor: nova utopia social?

LUIZ CARLOS MEREGE

O terceiro setor passou a ser uma realidade visível e merecedora da atenção dos estudiosos apenas recentemente, embora sua existência venha desde as origens de nossa civilização.
O terceiro setor pode ser definido como o conjunto de atividades das organizações da sociedade civil, portanto organizações criadas por iniciativas (privadas) de cidadãos, que têm como objetivo a prestação de serviços ao público (saúde, educação, cultura, habitação, direitos civis, desenvolvimento do ser humano, proteção ao meio ambiente).
Para melhor defini-lo, diz-se que congrega organizações sem fins lucrativos, muito embora seria melhor dizer que são organizações em que o possível lucro é reaplicado na manutenção de suas atividades ou distribuído entre seus colaboradores. Portanto, o lucro jamais é apropriado por um dono ou proprietário.
Suas receitas podem ser geradas em suas atividades operacionais (auto-sustentação), mas em sua grande maioria se originam de doações, principalmente das famílias, como também do setor privado e do governo.
Por essas características, os estudiosos do setor estão substituindo a terminologia "organizações não-lucrativas", por uma designação mais ampla e menos negativista. Elas hoje são categorizadas como organizações da sociedade civil (OSCs).
Entre as organizações que compõem o seu universo, destacam-se as fundações, as organizações não-governamentais (ONGs), os institutos, as associações comunitárias, as entidades de serviços sociais, as associações de classes, as entidades religiosas e as comissões de defesa dos direitos do cidadão.
Infelizmente, por problemas conceituais, não foi dado a esse setor um lugar a parte nas contas nacionais dos países, para se poder mensurá-lo, examinar e definir sua estrutura e estudar sua relação com os outros setores. Suas atividades estão enquadradas no setor de serviços, misturadas com instituições que têm fins lucrativos, o que não permite a sua visibilidade.
Longe de ser uma utopia, o terceiro setor é uma surpreendente e vibrante realidade nas economias modernas. Um estudo comparativo entre sete países (Estados Unidos, Japão, França, Alemanha, Reino Unido, Itália e Hungria), realizado pela Johns Hopkins University, revelou dados agregados que chamaram a atenção dos analistas pela sua importância frente a outros setores da economia.
A dimensão do terceiro setor nessas economias desenvolvidas é bastante significativa, atingindo em média 3,5% do PIB.
Tomando-se como referência a agricultura, que em média participa com 10% do PIB nesses países, pode-se notar o grau de importância desse setor.
Nos EUA, o terceiro setor participa com um percentual que é praticamente o dobro daquele encontrado nos demais países: 6,3%. No Reino Unido, chega a 4,8%.
O volume de recursos movimentado pelo setor chega a US$ 660 bilhões no conjunto de países pesquisados, sendo que nos Estados Unidos atinge US$ 320 bilhões, exatamente a metade do PIB brasileiro. No Japão, o terceiro setor movimenta US$ 95 bilhões, sendo o país que aparece em segundo lugar pela dimensão dos recursos movimentados pelas OSCs.
Mas é na geração de emprego que o setor ganha em importância, tendo em vista a catástrofe que a terceira revolução industrial tem causado no nível de emprego em todos os países. Enquanto os outros dois setores, governo e privado, vêm praticando um processo de exclusão sem precedentes de trabalhadores, o terceiro setor vem apresentando taxas surpreendentes de criação de novos postos de trabalho.
As taxas de crescimento do emprego no setor foram bastante elevadas entre 1980 e 1990, superando os 11% em média nos países pesquisados. Na França, o percentual de crescimento atingiu 15,8%, enquanto que nos Estados Unidos foi de 12,7% e na Alemanha, de 11%.
Como resultado desse crescimento, o setor apresenta participação de 6,8% no total de emprego nos Estados Unidos e de 4,2% e 3,7%, respectivamente, na França e na Alemanha.
A importante conclusão que se chega é que no desenho da sociedade moderna um terceiro setor aparece como que criando um tripé sobre o qual os sistemas econômicos se apoiarão.
Nesse redesenho da sociedade, esse tripé, formado por governo, setor privado e terceiro setor (ou setor social), oferece os meios para trabalharmos pela diminuição das desigualdades sociais e econômicas e possamos construir uma sociedade mais justa.
O terceiro setor abre as oportunidades para botarmos a mão na massa na construção dessa sociedade, mas o seu fortalecimento depende de nossas iniciativas, da cooperação e suporte dos outros setores da sociedade.

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