São Paulo, quinta-feira, 20 de junho de 1996
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De greve e espetáculo

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Em um país de escassa tradição de mobilização, qualquer greve deveria ser encarada como um exercício saudável, a menos, é claro, que suas causas sejam indefensáveis.
Não é o caso da greve geral de amanhã, para a qual há justificativas.
O problema da greve de sexta-feira é de outra natureza.
Ponto 1 - Greve nacional, no Brasil, dificilmente funciona. Há abissais diferenças de todo tipo entre regiões e até entre Estados vizinhos. Diferenças, inclusive, de ciclo econômico, que fazem com que, em alguns Estados, a situação seja mais difícil do que em outros e, portanto, diferente o apelo de uma greve.
Ponto 2 - Decorrência do anterior: se a situação estrutural e conjuntural varia tanto, é razoável supor que variará também -e bastante- a adesão à greve.
Cada lado da disputa poderá avaliá-la à luz de suas conveniências. O governo poderá mostrar fotos de shoppings centers fervilhando de gente e dizer: "Viu, ninguém aderiu".
O sindicalismo poderá mostrar fotos, por exemplo, da fábrica da Volks parada em São Bernardo do Campo e dizer: "Viu, a adesão foi maciça".
Ponto 3 - Corolário do anterior: no "day after", pouca coisa terá mudado. O governo não se sentirá compelido a alterar suas políticas, ante a previsível falta de evidências de um descontentamento generalizado e disseminado.
O sindicalismo tampouco se verá forçado a mudar suas táticas, ante a possibilidade de demonstrar que alguns setores e/ou regiões de fato aderiram significativamente à paralisação.
É verdade que o mundo de hoje é movido, muito, a espetáculo. E greve geral, ainda que não seja essa a intenção, vira sempre um espetáculo, com o inevitável componente lúdico do quem ganhou/quem perdeu. No mundo do espetáculo, passa-se rapidamente à próxima atração. Suspeito que caberá ao movimento sindical fornecê-la porque o governo não parece nem interessado nem capaz de fazê-lo.

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