São Paulo, sábado, 13 de julho de 1996
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Os paradigmas da política econômica

ANTÔNIO CORRÊA DE LACERDA

O debate sobre as alternativas da política econômica atual transformou-se em uma espécie de "diálogo de surdos". De um lado, os defensores da estratégia em curso argumentam que, sem aprovar as reformas no Congresso, não há espaço para flexibilizar a política econômica. Do outro, os críticos apontam a necessidade de ajustes.
É um fato que a política econômica do real transformou-se em uma "armadilha" que restringe o crescimento. Em função disso, a economia brasileira dificilmente vai crescer mais do que 3% neste ano, um desempenho muito abaixo do seu potencial e do necessário para gerar desenvolvimento.
Por outro lado, o custo da estabilização tem sido penoso para o setor produtivo brasileiro e o desempenho das contas públicas, com reflexos diretos no emprego.
Há pelo menos três focos de restrição ao crescimento sustentado: a área externa, o nível de investimentos e as contas públicas. O primeiro e o mais importante é a área externa, que vamos explorar mais detalhadamente neste artigo.
A valorização do câmbio, combinada com a abertura econômica, incentivou as importações, que provocaram uma mudança estrutural na esfera produtiva, com a redução do valor agregado local -ao mesmo tempo em que, pelo mesmo motivo, as exportações eram desincentivadas.
O resultado é que em 1995, enquanto as importações brasileiras cresceram 50%, as exportações evoluíram apenas 6,8%.
A consequência é que hoje, nessas condições, romper as amarras do crescimento implicaria quase diretamente um déficit na balança comercial. Isso poderia comprometer o resultado em contas correntes no balanço de pagamentos, que não deve, por precaução, superar a faixa dos 2% a 3% do PIB.
Portanto, nesse quadro, o cenário básico de comportamento da economia brasileira em 1996 praticamente está dado. Salvo algum pouco provável fator de desequilíbrio, o crescimento do PIB ficará próximo de 3% e a inflação, na média dos índices, dificilmente passará dos 12% acumulados.
Da mesma forma, a redução gradual da taxa de juros caminha para uma taxa real que aponta para menos da metade dos 33% acumulados no ano passado, e o câmbio deve seguir sem sobressaltos, acompanhando a diferença entre o IPA (Índice de Preços por Atacado) brasileiro e o americano.
No tocante à discussão das alternativas para a economia brasileira, tem sido um argumento recorrente dos que defendem a política atual de que uma alteração de rota dependeria da aprovação de reformas constitucionais.
O que vale discutir é, primeiro, se há como evitar, pelo menos em parte, o custo da política econômica atual; segundo, em que medida essas ações dependem das reformas constitucionais.
Está claro que o Estado, a questão fiscal, o sistema financeiro, a área da Previdência e outras necessitam de profundas reformas, até mais profundas do que as versões em discussão. Mas também é certo que não serão aprovadas e implementadas no curto prazo. A alternativa é agir pontualmente em questões não menos importantes, que podem trazer ganhos e reduzir o custo do ajuste.
A alternativa para reduzir a restrição externa e o desemprego é um aumento vigoroso das exportações, visando elevar a nossa participação em um mercado mundial que tem crescido cerca de 10% ao ano, no qual o Brasil vem perdendo participação relativa. Há aproximadamente dez anos, detínhamos 1,4% das exportações anuais; hoje, nossa participação não passa de 0,8%.
Para expandir as exportações, precisamos de um programa de promoção, a exemplo da estratégia de vários países ricos, além de reduzir os fatores sistêmicos que prejudicam a competitividade dos nossos produtos, conhecidos como "custo Brasil" -o que não depende tanto de reformas, mas de ações ao alcance do Executivo.
No tocante às importações, sem abrir mão da continuidade do projeto de abertura que, se bem conduzido, trará grandes benefícios, é preciso reforçar as defesas contra concorrência predatória e "dumping", que têm significado desnecessariamente queima de divisas e lugares de trabalho.
As reformas são importantes, algumas delas até mesmo imprescindíveis. Mas não podem servir de justificativa para o imobilismo em ações que podem diminuir os custos do programa de estabilização e queimar importantes etapas na busca das condições para o desenvolvimento sustentado da economia brasileira.
Um bom começo talvez seja olhar mais para o chamado lado real da economia e romper o paradigma e a visão simplista de que todos os que criticam a política econômica do governo são inimigos da estabilização.

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