São Paulo, domingo, 14 de julho de 1996
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O caos da ocupação do solo

MARCOS VELLETRI

Até 1930, o Brasil não tinha uma política demográfica definida, excetuando-se o incentivo à imigração, que visava suprir a demanda de mão-de-obra. O início do processo de industrialização levou ao incentivo da natalidade.
A necessidade de trabalhadores para a indústria nascente teve reflexos diretos nos textos constitucionais promulgados à época: "Ao Estado cabe socorrer as famílias de prole numerosa" (1934); "Às famílias numerosas serão atribuídas compensações na proporção de seus encargos" (1937). Medidas como essas levaram a taxa de crescimento demográfico, nas décadas de 50 e 60, à média anual de 3%.
O regime militar mudou a política demográfica, sob a justificativa, conceitualmente correta, de que uma explosão populacional seria obstáculo ao desenvolvimento.
Seguindo recomendação do FMI (Fundo Monetário Internacional) aos países em desenvolvimento, o Brasil adotou, então, uma ação "antinatalista". Pílulas, esterilização e outros métodos contraceptivos proliferaram-se no país.
O resultado foi a redução do crescimento populacional, que caiu para 2,49% ao ano, na década de 80, e 1,89%, em 1991, quando se realizou o último censo.
Esses dados salientam um imenso paradoxo nas políticas demográficas nacionais. Se, de um lado, o Estado foi sensível às tendências globais da economia, manipulando as taxas de natalidade, de outro, descuidou-se do equilíbrio da ocupação do território nacional.
As disparidades regionais, que se sedimentaram ao longo do século na economia brasileira, são visíveis na densidade demográfica dos Estados. No Amazonas, o índice é de 1,34 habitante por km2 e, em São Paulo, de 126,96/km2, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Nas regiões metropolitanas, o problema é ainda maior. Na Grande São Paulo, a densidade demográfica é de 1.912/km2; na Grande Rio, 1.520/km2.
Esses altos índices de densidade demográfica refletem negativamente na qualidade de vida da população. Alerta sobre a questão foi feito na Habitat 2, realizada em Istambul, demonstrando a necessidade de se evitar o caos nas grandes cidades, na virada do século.
O crescimento desordenado das metrópoles brasileiras gerou numerosas carências. A lei promulgada em 1972, oficializando as regiões metropolitanas, que deveria implicar o planejamento adequado dessas áreas, não saiu do papel.
Apesar da redução global do índice de natalidade no Brasil, nossas metrópoles continuam abrigando indicadores de qualidade de vida típicos do Terceiro Mundo.
Por isso, é fundamental e urgente corrigir erros históricos da ausência de ordenamento da ocupação do solo. Mais do que nunca, é preciso planejar núcleos de urbanização, que harmonizem, em espaços próximos, centros habitacionais e residenciais.
A adoção de uma nova política de ocupação do solo deve integrar um projeto global de desenvolvimento. Esse desafio precisa ser encarado de frente, para que o Brasil possa romper as fronteiras do Terceiro Mundo.

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