São Paulo, domingo, 14 de julho de 1996
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A confissão nativista

JOSÉ GERALDO COUTO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O advogado paulista Reinaldo Porchat, amigo de juventude de Euclides da Cunha, e o cunhado do escritor, Otaviano Vieira, foram dois dos mais frequentes destinatários de sua correspondência.
Estas duas cartas inéditas endereçadas a eles são contrastantes no modo de encarar o país.
Na primeira delas, a Porchat, o contexto é o da Revolta da Armada, movimento desencadeado no seio da Marinha em 1893 com o objetivo de depor o então presidente, marechal Floriano Peixoto. O Saldanha que aparece no primeiro parágrafo é o almirante Luís Felipe Saldanha da Gama, que aderiu à revolta, mas logo mostrou sua tendência monarquista.
Mas o mais interessante na carta é a confissão nativista -e até xenófoba- do escritor: "O estrangeiro, o estrangeiro que se diz civilizado -considero-o inimigo".
Chama a atenção também o temor de Euclides diante da fragmentação do país: "A nossa grande Pátria cindida pelas paixões decompor-se-á em minúsculos Estados?". Essa era, de certo modo, a proposta de outra revolta em curso na época, a Revolução Federalista desencadeada no Sul.
Na carta a Otaviano Vieira, escrita 16 anos depois, o tom já não é de temor ou perplexidade, e sim de pessimismo e amargura. Distante do nativismo, Euclides manifesta "nostalgias de um inglês 'smart' perdido numa enorme aringa da África Central".
Refere-se ainda ao concurso que prestou para o Ginásio Pedro 2º. Apesar de ter ficado, por pressões políticas, com o cargo de professor de lógica, o concurso havia sido vencido por Farias Brito, a quem Euclides alude, sem nomeá-lo, com espantoso ressentimento.
(JGC)

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