São Paulo, segunda-feira, 22 de julho de 1996
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Periferia de SP 'transborda' e exporta moradores para as cidades vizinhas

JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
DA REPORTAGEM LOCAL

São Paulo chegou à sua última fronteira. A população paulistana migrou progressivamente do centro para a periferia e, desde a última década, tem "transbordado" para cidades vizinhas.
Entre 80 e 91, a capital expulsou 756 mil pessoas além do que recebeu -majoritariamente pobres. Junta, essa população formaria a quarta maior cidade do Estado, à frente de municípios como Osasco e São Bernardo do Campo.
Apenas distritos da extrema periferia, como Guaianazes (leste) e Parelheiros (sul), continuaram crescendo na velocidade alucinante das décadas de 50 e 60. Não por acaso, são as regiões mais excluídas da capital.
Agora, até os bairros pobres e periféricos dão sinais de terem alcançado seu ponto de saturação. Alguns demógrafos crêem que pode haver um refluxo de parte dessa população para regiões centrais.
Movimento concêntrico
É como se uma pedra caísse no centro da cidade, provocando uma onda de crescimento em direção às margens: uma parte dessa onda ultrapassou a fronteira, e outra parcela -menor- bateu na borda e voltou.
"Há uma possibilidade de reversão (da 'periferização')", acredita o professor doutor de Geografia Urbana da Universidade de São Paulo, Francisco Capuano Scarlato.
O aumento da população de rua no centro de São Paulo já pode ser um sintoma desse novo fenômeno -sugere o geógrafo.
Se essa hipótese se confirmar, o futuro prefeito paulistano terá mais um problema pela frente: o "encortiçamento" do cinturão intermediário da cidade (junto com a favela, o cortiço é opção mais barata de moradia).
Em paralelo, o prefeito terá de enfrentar os efeitos do crescimento desordenado rumo à periferia: a oferta insuficiente de serviços públicos nessas regiões e a ociosidade de equipamentos urbanos no centro.
Na década passada, segundo a Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados), os distritos centrais e seu entorno perderam 236 mil habitantes. É o mesmo que riscar do mapa a população do Guarujá (SP).
Ociosidade
Isso não ficou barato. A Vila Guilherme, distrito próximo ao centro, tem hoje menos de 27 mil habitantes e unidades de saúde em número suficiente para atender 140 mil pessoas.
No extremo oposto da cidade, 105 mil dos 125 mil moradores de Socorro (sul) ficam sem ter aonde ir quando estão doentes.
Autora do Mapa da Exclusão Social da Cidade de São Paulo, a vereadora e professora da PUC-SP, Aldaíza Sposati, diz que esse não é o único contraste gerado pela "periferização".
Na República (centro), há 5,16 empregos por habitante, enquanto na extrema zona leste, em José Bonifácio, a relação se inverte: há 1 emprego para cada grupo de 10 moradores.
"De dia, a população vai trabalhar e se aglomera no centro. À noite e no fim-de-semana, o centro fica vazio, e a periferia enche", descreve a vereadora.
Esse vaivém responde por boa parte dos problemas de trânsito: grandes massas de pessoas se deslocando no mesmo sentido e ao mesmo tempo provocam imensos congestionamentos.
Efeito centrífugo
"Esse efeito centrífugo (que expulsa as pessoas do centro) causou uma deterioração brutal da qualidade de vida. Quanto mais longe, maior o tempo de viagem e mais conduções a pessoa tem que pegar", diz o demógrafo José Marcos da Cunha.
Ele atribui o problema à inação do Estado. Atraída pela oferta de loteamentos baratos e muitas vezes irregulares, a população pobre deixou os aluguéis no centro para construir suas casas na extrema periferia.
Como resultado, o índice de propriedade da habitação é muito maior nos bairros periféricos e pobres do que nas ricas áreas centrais. Mas isso se deu à custa de invasões de áreas de preservação ambiental e mananciais.
Como solução, os especialistas apostam na descentralização dos serviços públicos e em núcleos regionais de geração de emprego -além, é claro, de parar de construir imensos conjuntos habitacionais na periferia, que só agravam o problema.

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