São Paulo, sexta-feira, 26 de julho de 1996
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Choque com Menem desgasta Cavallo

DANIEL BRAMATTI
DE BUENOS AIRES

O mercado argentino viveu ontem um dia de pânico por causa dos rumores sobre a possível renúncia do ministro Domingo Cavallo (Economia), que vive uma nova crise de relacionamento com o presidente Carlos Menem.
A Bolsa se movimentou ao sabor das versões sobre as consequências da última briga, ocorrida anteontem, quando Cavallo se recusou a assinar decreto elaborado por Menem e ameaçou renunciar.
Segundo a imprensa local, o presidente teria desafiado o ministro a concretizar a ameaça. Para espanto dos demais participantes da reunião, Cavallo teria se levantado e deixado a sala sem dizer nada.
Quando soube da discussão, o chefe de gabinete, Jorge Rodríguez, assumiu o papel de bombeiro e saiu à procura do ministro. Conseguiu acalmá-lo e trazê-lo para uma cerimônia na Casa Rosada.
Na manhã de ontem, durante a reunião semanal do gabinete ministerial, assessores de Cavallo aumentaram a confusão ao distribuir um comunicado com uma nova ameaça de renúncia.
Tensão
"Se o Congresso desautorizar o Executivo e não apresentar alternativas para reduzir o déficit, não poderei, como ministro, continuar gerenciando a economia", escreveu Cavallo no documento distribuído ontem.
O esclarecimento sobre o comunicado só veio horas depois: tratava-se de uma frase retirada de uma entrevista coletiva do ministro, concedida na última quinta-feira.
Ontem, Menem saiu da reunião sem falar com a imprensa. Mais tarde, na inauguração de uma estrada, disse que a briga com Cavallo "nunca existiu".
No mercado, o desmentido não foi levado a sério. A Bolsa de Buenos Aires chegou a cair 3%, na contramão da Bolsa de Nova York. No final do pregão houve uma leve recuperação e as ações líderes fecharam em queda de 1,3%. No mês, a queda acumulada em Buenos Aires chega a 4%.
O ministro não se preocupou em desmentir pessoalmente os rumores. Somente no final da noite ele convocou uma entrevista para reafirmar sua permanência no cargo.
Fragilidade
O decreto que Cavallo se negou a assinar recriava uma contribuição social para o setor bancário. A contribuição havia sido eliminada pelo próprio ministro, há alguns meses, sob o argumento de que o custo estava sendo repassado para as taxas de juros.
A decisão de Menem de anular a medida demonstra o grau de enfraquecimento de Cavallo no governo. O ministro vive um de seus piores momentos, por causa da péssima repercussão das últimas medidas destinadas a reduzir o déficit público.
O pacote contra o déficit, decretado há duas semanas, reduziu a renda de pelo menos 1,8 milhão de trabalhadores, ao mudar o regime de pagamento dos salários-família. A CGT (Confederação Geral de Trabalhadores) convocou uma greve geral contra as medidas para o próximo dia 8.
Cavallo adotou as medidas emergenciais por causa da baixa arrecadação de impostos. O rombo nas contas públicas chegou a US$ 2,5 bilhões no primeiro semestre -valor projetado para todo o ano no acordo com o FMI (Fundo Monetário Internacional).
Uma das causas da baixa arrecadação é a fraca reativação da economia, depois da recessão provocada pela crise mexicana.
Neste âmbito, Cavallo também recebeu más notícias. O último relatório divulgado pela FIEL (Fundação de Investigações Econômicas Latino-americana) indica que a produção industrial caiu 2,4% em junho em relação ao mesmo mês do ano passado.

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