São Paulo, sábado, 27 de julho de 1996
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A terceira onda

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Até a virada do século -é o que me garante sustancioso artigo de uma revista inglesa- pertencerei a mais uma das muitas minorias em que desde já me incluo. Não fumo maconha, que mais dia menos dia será liberada. Fumo cigarros, que acabam de ser proibidos em recintos fechados. Como gosto de fumar preferencialmente em casa, que é um recinto fechado, estou violando a lei. Só não caí na marginalidade porque já estava nela: de minha temporada cubana, habituei-me a fumar charutos.
Minoritário, marginal e tabagista, podia me dar por um fora-da-lei assumido, mas há mais. A revista inglesa garante que no ano 2000 o heterossexualismo poderá não ser proibido, mas será de tal forma discriminado que o mais prudente será aderir, por gosto ou sobrevivência social.
Quando FHC fala em nova onda em fico apavorado. Na preocupação de ser moderno e globalizado, ele pode tomar conhecimento da tal revista inglesa e baixar um decreto proibindo o heterossexualismo em recintos fechados ou abertos.
A preservação da espécie -segundo a revista- será garantida pela proveta, que já deu excelentes resultados genéticos e laboratoriais. Poderei ter um filho com uma nativa das ilhas Papuas que nunca vi e nunca me viu -globalização é também para essas coisas.
Somando-se a isso o sexo virtual, teremos um final de século mais asséptico e arrumado do que uma farmácia de homeopatia. Haverá descontentes, que sempre os houve, vanguardas do atraso que aporrinham e poluem a humanidade sadia e o mundo moderno com seus cigarros cancerígenos e suas cópulas machistas.
Resumindo: o careta está com seus dias contados. Por ora, é tolerado com seus cigarros (em recintos abertos) e suas condenáveis perversões sexuais. Mas até 2000, na terceira onda que nos prometem, eles serão exterminados da face da Terra, primeiramente pelo uso, depois pela lei.

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