São Paulo, terça-feira, 30 de julho de 1996
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"Rombos", inquilinos e construtoras

ALOYSIO BIONDI

O governo está anunciando uma série de medidas para reduzir os rombos acumulados no sistema financeiro habitacional, administrado pela Caixa Econômica Federal.
Não estão em jogo apenas os bilhões do FCVS -Fundo de Compensação de Variações Salariais, criado para pagar o "resto" de dívidas que sobra no final dos contratos de financiamento da casa própria assinados até 1986. Há, também, bilhões de reais do FGTS -Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, emprestados a construtoras.
À primeira vista, as medidas parecem rigorosas, chegando-se a pensar em forçar a venda de imóveis financiados pelo SFH que, no entanto, foram alugados a inquilinos.
Como sempre, porém, por trás do rigor contra os lambaris escondem-se medidas de privilégios a grupos econômicos, que aumentarão o rombo da CEF, do FGTS (que ela administra) e do Tesouro.
* Construtoras - no governo Collor, houve um "empréstimo jumbo" para a construção de 300 mil moradias populares, com dinheiro do FGTS.
Além de desviar parte do dinheiro, as construtoras burlaram os contratos e fizeram imóveis mais caros. Resultado: 190 mil desses imóveis estão encalhados, sem compradores até hoje, quatro anos depois.
Dentro do "pacote" anunciado não se prevê nenhuma medida rigorosa para cobrar as construtoras, que, obviamente, não estão devolvendo o dinheiro do FGTS que tomaram emprestado junto à CEF.
* Sem preço - anuncia-se também que há milhares de imóveis vendidos nos últimos anos que estão com dívidas exageradas -isto é, o saldo dos financiamentos chega a ser maior do que o valor que o comprador pagaria hoje pelo imóvel no mercado.
Nesses casos, a CEF pensa em "reduzir" o valor da dívida, perdoando parte do saldo, e aumentar o número de prestações.
A decisão é inaceitável: transfere para a CEF, o Tesouro, um prejuízo que não é seu. Nesses casos, a CEF apenas forneceu o dinheiro para construção do imóvel a uma empresa privada, que realizou toda a operação com o comprador, fixando, inclusive, a margem de lucro que desejava.
É uma operação entre empresa e comprador. Não cabe à CEF assumir eventuais prejuízos provocados por oscilações de mercado. A dilatação de prazo de pagamento é a concessão máxima a ser feita.
* Imóveis "podres" - com recursos próprios, isto é, fora do SFH, os bancos também financiam a compra de imóveis por seus clientes. Essa carteira (hipotecária) está com nada menos que 60% de índice de atraso no pagamento de prestações.
E são essas carteiras "podres" que a equipe FHC está obrigando a CEF a comprar, com a aplicação de alguns bilhões de reais...
Os lambaris
Nem todo comprador de imóvel financiado pelo SFH que o alugou a um inquilino é um "especulador" beneficiado pelo crédito barato subsidiado.
Há quem, ao longo dos anos, tenha se mudado para um imóvel maior, também pagando aluguel.
As regras devem prever tratamentos diferenciados.
Punição
Obrigar o comprador a pagar o saldo devedor, que deixaria, portanto, de ser coberto pelo FCVS, parece punição suficiente. Elimina-se o subsídio do Tesouro e reduz-se o rombo.
Confissão
Um dos maiores bancos do país anuncia que conseguiu receber, no primeiro semestre de 96, nada menos que R$ 1,0 bilhão em "créditos duvidosos" lançados no balanço de 95.
A história não é bem essa. Como esta coluna se cansou de alertar meses atrás, os bancos exageraram no lançamento de "créditos duvidosos" em 95. Macete para "reduzir" os lucros no balanço. E pagar menos Imposto de Renda.
Estratégia
Em 1995, o IR chegava a 35% (mais a contribuição sobre o lucro). Em 1996, o IR foi reduzido para 25%. "Adiar" os lucros foi um alto negócio.
Recessão
Governo federal anuncia queda de 2,8% na arrecadação do semestre. Tentou esconder que, só em junho, ela foi de 12%.

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