São Paulo, sexta-feira, 2 de agosto de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Banco do Mercosul é mais uma agência de sinecuras

SÉRGIO RIBEIRO DA COSTA WERLANG

Recentemente, a idéia de formação de um banco de fomento para a região do Mercosul tem tido algum eco. O principal defensor da nova agência de sinecuras é o ex-embaixador da Argentina no Brasil Alieto Aldo Guadagni.
O banco seria mais um órgão público, só que atuante em nível internacional. O nobre objetivo de tal instituição seria o de financiar projetos estratégicos de longo prazo na região do Mercosul.
A existência de bancos de fomento é muito discutível, mas a justificativa é sempre a mesma: projetos de longa maturação apresentam muito risco, e o setor privado só estaria disposto a emprestar recursos a uma taxa de juros tão elevada que tornaria a empreitada pouco lucrativa ou mesmo deficitária.
Mas esse fato, por si só, não os torna menos necessários para a população. O exemplo típico é o de infra-estrutura de transportes -rodovias e ferrovias.
Esse argumento é muito polêmico, uma vez que projetos muito arriscados são quase sempre financiados pela emissão de participações acionárias, em vez de empréstimos. Além disso, é muito discutível que o setor público saiba escolher de forma eficiente entre as inúmeras alternativas de investimento que lhe são apresentadas.
Contudo, o fato concreto é que há muitas agências de fomento em todo o mundo. Dentre elas, por exemplo, Banco Mundial, BNDES (segundo maior banco de desenvolvimento do mundo) e BID. Mesmo nos EUA há uma pequena agência de fomento, a Opic (Overseas Private Investment Corporation), responsável pela concessão de um seguro de risco político.
É claro, cada uma dessas entidades funciona e é financiada de forma distinta, mas todas têm objetivos semelhantes: o de aportar recursos para investimentos que ou não seriam realizados ou o seriam de forma "inadequada" ao bem público.
O principal problema com o banco do Mercosul é outro. Mesmo que se tome como dado que possa haver algum papel para a intervenção governamental no financiamento de projetos de longo prazo, será que haveria necessidade de outro banco de desenvolvimento para projetos do Mercosul?
Em resposta à pergunta, é interessante observar um paralelo. Há mais de seis anos, surgiu no brasil a idéia de se fazer um eximbank nacional. Seria um banco público, com o objetivo de financiar o comércio exterior.
A criação de um eximbank não foi adiante, por dois motivos. Primeiro, o setor privado hoje cuida da maior parte do financiamento de exportações e importações.
Segundo, as transações mais longas e ainda não atraentes ao setor privado podem ser perfeitamente atendidas pelo BNDES (pelo Finamex). Lembrem-se de que o BNDES é o segundo maior banco de desenvolvimento do Brasil.
Exatamente pelos mesmos motivos, a criação do banco do Mercosul não apresentava vantagens para o Brasil. A quase totalidade dos projetos de interesse do Brasil no Mercosul terá motivação privada, isto é, será de interesse do setor privado brasileiro.
Portanto, das duas uma. Ou o próprio setor privado encarrega-se de viabilizá-los financeiramente ou o BNDES financia o empreendimento. Não seria absurdo que o BNDES emprestasse para projetos fora do país, desde que esses projetos fossem de interesse do setor privado (ou até mesmo público) brasileiro. Por exemplo, a agência americana Opic financia projetos de interesse norte-americano fora dos EUA.
Por essa razão, a existência de um banco do Mercosul é completamente supérflua do ponto de vista do Brasil. Se houver disposição de ir adiante com a formação dessa instituição, o governo brasileiro não deveria aportar recursos. Seria uma duplicidade de tarefas inútil e uma mera criação de novos empregos públicos sem função.

Texto Anterior: Tarifas bancárias e adoração do Estado
Próximo Texto: Indicadores dos EUA animam Bolsas
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.