São Paulo, sexta-feira, 2 de agosto de 1996
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Um marco na modernização

LUÍS NASSIF

Certamente não merecerá o destaque devido. Mas ontem, na Bolsa de Valores de São Paulo, registrou-se o primeiro evento de um processo que vai mudar a face do capitalismo brasileiro, com o lançamento do Fundo de Investimentos em Empresas Emergentes de Santa Catarina.
Com capital de US$ 35 milhões, o fundo foi constituído para investir em empresas emergentes do Estado, que tenham potencial de rentabilidade, gestão e capacidade de abrir capital no médio prazo.
Trata-se do primeiro passo concreto em direção a uma bandeira defendida há anos pela coluna: a democratização do capital e a regionalização das oportunidades de acesso a investimentos.
Historicamente, o modelo econômico brasileiro foi centrado numa espécie de monopólio da poupança pela União.
Esse modelo foi o responsável pela enorme concentração econômica e política no eixo Rio-São Paulo, fazendo com que o desenvolvimento brasileiro fosse comandado por grupos empresariais definidos politicamente dentre os aliados do poder.
Agora, ocorrem dois fenômenos relevantes. Numa ponta, a crise dos grandes grupos empresariais nascidos no velho modelo. Na outra, o aparecimento de uma florescente geração de novas empresas, constituídas por empresários schumpeterianos, que se fizeram longe do poder central e do eixo Rio-São Paulo.
Saídas para crise
Esse modelo de fundo será fundamental para financiar o segundo tempo do jogo, alavancando empresas preparadas para se tornar futuras sociedades anônimas clássicas.
Inicialmente, foi constituída uma empresa de participações -a Santa Catarina Administração de Fundos-, pelo Banco de Santa Catarina (Besc), pela Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (Fiesc) e pela corretora Fator, de São Paulo -autora da idéia.
Essa empresa lançou o Fundo de Empresas Emergentes, conseguindo cinco investidores dispostos a subscrever o capital total de US$ 35 milhões -o Besc, a Fiesc, a Bolsa de Valores de São Paulo, o BNDESpar (BNDES Participações) e o Previ, fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil.
Primeiro, a Fiesc procede a uma pré-seleção das empresas com potencial. Essas empresas serão analisadas pelo BNDESpar. Depois, as proposta serão submetidas a um conselho de investidores do fundo, constituído de oito membros: cinco indicados pelos cotistas e três, pelo conselho administrativo.
Aprovado o investimento, os cotistas integralizam a subscrição e aplicam na empresa.
Quando o último centavo dos US$ 35 milhões estiver aplicado, procede-se à segunda etapa do jogo: a abertura de capital do fundo.
Liquidez
Há duas vantagens nesse processo. A primeira é que o fato de abrir o capital obrigará o fundo -e as empresas em que investiu- a trabalhar de maneira transparente com os investidores.
A segunda vantagem é conferir liquidez ao fundo. Se algum cotista quiser sair antes, poderá vender suas cotas no mercado.
Se não quiser sair, o fundo será biodegradável. Seu prazo máximo será de dez anos.
A capitalização das empresas se fará por meio de mecanismos de debêntures, de tal maneira que o tempo médio do investimento será de quatro anos.
Ao final do vencimento de cada debênture, se a empresa decolou, o fundo vende as ações no mercado e paga os cotistas. Se não decolou, recebem-se os juros previstos na emissão da debênture.
Nova geração
Esse modelo será estendido em breve para as federações das indústrias de Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul -que, com Santa Catarina, formam o quadrado modernizador que está mudando a face da representação empresarial no país.
Banco Central
Não havia razões objetivas para o movimento com dólares na última quarta-feira.
Ocorreu porque o BC tomou duas atitudes imprevistas. De um lado, deu reajuste maior ao dólar. De outro, não reduziu as taxas de juros, como se esperava, sinalizando para uma mudança de regime cambial e monetário -que provavelmente não ocorrerá.
Nesse contexto, mesmo os boatos mais improváveis (como os de mudanças no câmbio na Argentina) tornaram-se factíveis e o resultado foi a volta da agitação no mercado de câmbio.
O BC deve explicações sobre a lógica que o levou a transformar garoa em tempestade.

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