São Paulo, sábado, 3 de agosto de 1996
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Análise fica na superfície

MARILENE FELINTO
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Escultora francesa, aluna e amante de Rodin, é assim que se trata Camille Claudel -como um apêndice de Auguste Rodin. Ela, cuja obra permanece encerrada em uma "sala Camille Claudel" no museu Rodin, em Paris.
Mostrar que Claudel enlouqueceu porque era mulher oprimida pela sociedade patriarcal machista é um dos objetivos do livro da psicoterapeuta jungiana Liliana Wahba. "A função criativa de Camille, que foi inibida, adquiriu autonomia projetando-se na figura de Rodin, que se transformou, após a dolorosa ruptura, em um animus demoníaco e perseguidor", diz Wahba.
A tese de Wahba é a de que o sofrimento de Claudel vinha do fato de ela ser uma personalidade criativa além do contexto social em que vivia. Incapaz de corresponder a expectativas sociais, a escultora refugiou-se no delírio "para se proteger dos conflitos insolúveis, em que aspectos pessoais e culturais se entrelaçam".
Wahba tenta decifrar o caso clínico de Camille Claudel dividindo em quatro partes vida e obra da escultora, em uma espécie de biografia e análise psicológica da artista.
O livro enfoca primeiramente as relações de Claudel com a mãe que a rejeitou e com o pai autoritário. Depois é a vez do relacionamento íntimo e competitivo com o irmão Paul Claudel, também artista, e principalmente, com Rodin, o mestre e o monstro.
Mas o fato é que a ambiciosa proposta do livro de Wahba -"estudo do complexo processo de criatividade com seus aspectos construtivos e destrutivos"- não sai da superfície.
Não tira conclusões específicas do caso Claudel, a não ser constatações óbvias como o fato de que a doença da artista seria hoje controlada, e ela não passaria de uma "excêntrica" a viver quase normalmente na sociedade.
Os aspectos biográficos -como as dificuldades materiais, a separação de Rodin, as condições do asilo em que ela viveu 30 anos, as cartas que escreveu etc. -misturam-se com generalizações de análise psicológica.
O livro de Wahba não é um estudo profundo da obra de Claudel. É antes tentativa de criar sala própria para a obra e a vida da artista que ousou, e da mulher que experimentou a "frustração do feminino malvivido", seja lá o que isso signifique. (Marilene Felinto)

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