São Paulo, domingo, 4 de agosto de 1996
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BB: lucro contábil

CELSO PINTO

A estratégia do Banco do Brasil de concentrar a absorção de prejuízos deve ajudar a gerar lucros já no segundo semestre deste ano. Isso não quer dizer, contudo, que ele voltará a operar com lucro. Na melhor das hipóteses, isso só acontecerá no segundo semestre do próximo ano, na previsão do presidente do BB, Paulo César Ximenes.
Em outros termos, o "realismo contábil" do banco ajudou a esvaziar esqueletos do armário, na imagem popularizada por Brasília. Mas ainda não conseguiu transformar o BB num banco lucrativo. Para isso, diz Ximenes, ainda será preciso enxugar bastante a estrutura do banco e mudar as ênfases em direção a operações mais rentáveis.
"É difícil ganhar dinheiro aplicando 60% dos recursos na agricultura", lamenta. Mas, se o BB não for o banco do setor agrícola, com sua gigantesca rede de agências, então para que deveria existir?
Essa é a essência do drama do BB. Quanto mais público for, mais longe estará da recuperação de sua rentabilidade e prestígio. Quanto mais se guiar por critérios e ênfases dos outros bancos privados, menos conseguirá justificar sua existência.
A diferença entre o lucro contábil e a volta do lucro operacional é fácil de explicar. Ao tomar R$ 8 bilhões para cobrir buracos acumulados em décadas de maus empréstimos, o BB decidiu realizar todos os prejuízos passados e ainda reservar uma margem para problemas futuros.
Com isso, fez uma superprovisão para perdas com empréstimos, que ajudou a levar o prejuízo do banco ao recorde absoluto da história das perdas de bancos em todo o mundo: R$ 4,4 bilhões no segundo semestre do ano passado e mais R$ 7,8 bilhões no primeiro semestre deste ano. O provisionamento para empréstimos duvidosos chegou a R$ 8,9 bilhões, dos quais cerca de R$ 6,5 bilhões na carteira geral e o restante no setor agrícola.
Em termos proporcionais, as provisões do BB subiram para 29% do total de R$ 30,8 bilhões em empréstimos, muitas vezes acima da média do sistema bancário. A provisão é uma reserva em dinheiro equivalente ao valor do empréstimo de recebimento duvidoso, incluindo principal e juros até a data. Só que os juros e as multas continuam a ser acumulados, contabilmente, sobre estes empréstimos.
Para recuperar os empréstimos, os bancos, normalmente, acabam oferecendo algum desconto aos devedores. Se o banco consegue recuperar o empréstimo, libera automaticamente a provisão. E se o valor inclui ao menos parte dos juros posteriores à data do provisionamento, cria-se uma receita extra a ser apropriada.
Ximenes estima que o BB recuperará mais de R$ 2 bilhões em empréstimos duvidosos este ano. Portanto, esse é um dinheiro que deverá sair direto das provisões para engordar os resultados. Daí porque o BB poderá gerar lucro no segundo semestre, mesmo que ainda registre prejuízo operacional.
Mesmo que agrade seus acionistas e o mercado com a volta do lucro, permanecerá o desafio maior para o BB, o de operar com lucro. No ano passado, o banco conseguiu reduzir 30 mil funcionários; e, no primeiro semestre deste ano, mais 10 mil. Mesmo assim, continua com 106 mil funcionários. Ximenes avisa que o enxugamento vai continuar, sem falar em números.
Fernando Amaral, representante dos funcionários no Conselho, diz que o BB, com supercautela, desmantelou as operações de crédito, que são as mais lucrativas, ainda que embutam algum risco. Ele argumenta que o BB resolveu transformar-se num "banco de fee", cobrador de tarifas por serviços, em vez de usar sua rede para lucrar com o crédito.
Ximenes rebate dizendo que foi a falta de cuidado com as operações de crédito que levou o BB aos megaprejuízos e que não adianta reabrir de vez os guichês antes de ter uma nova estrutura que impeça a repetição de erros. Isso leva tempo. Até lá, o Tesouro, que se tornou dono de 82% do capital do banco, continuará a bancar o jogo. "Nossa sorte é que o Tesouro é um investidor de longo prazo", ironiza Ximenes.

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