São Paulo, domingo, 4 de agosto de 1996
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Terapia com 1 só remédio é condenada por médicos

DA REPORTAGEM LOCAL

Tema é assunto de debate

Terapia com 1 só remédio é condenada
Tão importante quanto a descoberta e o acesso a novos medicamentos anti-Aids é a forma como eles são administrados. O uso de uma única droga -a monoterapia- vem sendo condenado pela maioria dos especialistas.
A polêmica em torno da associação de medicamentos foi um dos temas principais do debate sobre "Novos Caminhos na Luta Contra a Aids", realizado no auditório da Folha na última quarta-feira.
O médico Caio Rosenthal, do Hospital Emílio Ribas, disse que desde o ano passado os estudos comprovam que não se justifica mais o uso de um único remédio. "Ficou provada a vantagem da associação de drogas."
Rosenthal disse que essa regra só não vem sendo seguida pelo laboratório Merck Sharp & Dohme.
O laboratório tem no Brasil um protocolo de pesquisa com a cerca de 900 pacientes. Um grupo recebe três medicamentos -AZT, 3TC e Indinavir. Um segundo, AZT e 3TC. O terceiro grupo é tratado só com Indinavir.
O protocolo originário, iniciado no ano passado, tinha um grupo recebendo apenas AZT. Apesar dos apelos de médicos e ONGs, só recentemente a Merck incluiu o 3TC para esse grupo.
Rosenthal disse que a "pesquisa é antiética e indigna" porque mantinha e ainda mantém pacientes tomando apenas um medicamento, quando uma combinação poderia prolongar suas vidas.
Eduardo Motti, diretor de pesquisas clínicas da Merck Sharp, disse que a monoterapia "ainda é considerada adequada para o tratamento de pacientes virgens", aqueles que ainda não receberam medicamentos.
"Quando se começa uma pesquisa, ninguém é dono da verdade", afirmou. O diretor lembrou que a pesquisa foi aprovada por uma comissão de ética dos centros médicos onde é feita e de uma segunda comissão independente.
As drogas
O AZT e o 3TC são antivirais de primeira e segunda geração que atacam uma enzima do vírus importante para sua multiplicação, a transcriptase reversa. O Indinavir, medicamento da Merck, dificulta que o vírus amadureça e invada novas células. Atacado nessas duas frentes, a multiplicação do HIV estaria sendo barrada.
O infectologista Vicente Amato Neto considerou "auspicioso" o fato de o país estar experimentando medicamentos de "primeira mão". Em março, uma comissão do FDA -órgão do governo americano que controla drogas e alimentos- esteve no país e aprovou as pesquisas em andamento.
Mário César Scheffer, diretor do Grupo Pela Vidda (ONG de apoio a soropositivos), disse que o laboratório escolheu o Brasil para as pesquisas por causa do grande número de pacientes "virgens de tratamento". "Os brasileiros estão sendo cobaias", disse.

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