São Paulo, domingo, 4 de agosto de 1996
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Brasileira aguarda libertação após dez anos

IGOR GIELOW
DO ENVIADO ESPECIAL

Presa há dez anos, a brasileira Lamia Maruf Hassan costuma brincar dizendo que "se vingou de Israel". Como? "Aprendi a ler e escrever três línguas que não conhecia. Vou sair melhor do que entrei", é a resposta.
Lamia, considerada a única presa política brasileira, cumpre pena de prisão perpétua por envolvimento na morte de um soldado israelense em 1984.
Quando entrou na cadeia de Asharon (que fica perto de Tel Aviv), em março de 1986, a amazonense Lamia falava português e "arranhava" o árabe. Hoje, aos 32 anos, fala e escreve português, árabe, hebraico e inglês.
Líder nata
A Folha conversou com pessoas com acesso, restrito, a Lamia em Israel. Elas a descrevem como "extremamente otimista" em relação à sua libertação.
Os oficiais da prisão a consideram "uma líder nata", que aperfeiçoou sua educação e politização na cadeia. Ela gosta de escrever poesia -em hebraico.
Além das revistas e jornais que a Embaixada do Brasil lhe envia quinzenalmente, Lamia lê muito sobre o processo de paz no Oriente Médio e sobre a relação entre árabes e israelenses.
Sabe que o segundo artigo do anexo 7º do acordo de paz sobre a Cisjordânia e a faixa de Gaza é claro sobre quem são os palestinos que devem sair da cadeia.
"Todas as detentas e prisioneiras devem ser soltas no primeiro estágio da libertação."
Lamia é uma das quatro últimas mulheres palestinas que ainda estão presas em Israel.
Se sair da cadeia e não for imediatamente deportada para o Brasil, Lamia tem planos de ficar na região. Ela manifestou interesse em ir a Ramallah (Cisjordânia), onde sua família tem negócios.
Gesto
Na semana retrasada, como prova de boa vontade ao presidente egípcio, Hosni Mubarak, o governo israelense disse que iria soltar as palestinas remanescentes.
Duas delas, que cometeram seus crimes em território israelense e por isso, estavam sob corte civil, foram perdoadas pelo presidente Ezer Weizman e soltas.
Uma ficou na cadeia, em solidariedade às três presas sob corte militar por terem agido em territórios ocupados -caso de Lamia.
A Associação de Vítimas do Terror Árabe entrou com recurso contra a libertação, mas ele foi negado pela Suprema Corte, o que pavimenta o caminho jurídico para a saída das outras.
Libertação
Após uma semana de expectativa, Lamia continua presa, esperando decisão do general Uzi Dayan, comandante da Área Central.
Mesmo com as dificuldades de informação típicas quando se trata de segurança de Estado, o governo israelense admite que a libertação é iminente.
Essa iminência será definida mais precisamente amanhã, quando o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu se encontra com o rei Hussein, da Jordânia.
E o presidente Hosni Mubarak volta ao Egito de uma cúpula com o presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton.
Hoje, para Israel, é uma vantagem estratégica ter as prisioneiras e detidos mais ilustres, como o xeque Ahmed Iassin (fundador do grupo terrorista palestino Hamas). Politicamente, eles são peças usadas para negociação.
Porém, com os jogadores se movimentando, será possível saber qual o novo peso que a libertação das prisioneiras terá no complicado xadrez político do Oriente Médio.
(IG)

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