São Paulo, sábado, 10 de agosto de 1996
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O problema não é a flexibilidade

DEMIAN FIOCCA
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O artigo inicial de "Flexibilidade do Mercado de Trabalho no Brasil", de José Márcio Camargo, e os quatro estudos que se seguem mostram, com objetividade e apoio de base empírica, que o mercado de trabalho brasileiro é, na prática, muito flexível.
Estimando para o Brasil um índice já calculado para outros países, Paes de Barros e Mendonça mostram que o mercado de trabalho nacional é duas vezes mais flexível que o norte-americano. Aqui, os salários reais variam duas vezes mais rápido do que nos EUA, para uma mesma alteração na taxa de desemprego.
As modificações legais sugeridas por Amadeo e Camargo conseguem escapar tanto do lobby contra os direitos e regulamentações trabalhistas quanto de resistências por vezes baseadas mais na desconfiança do que na consideração minuciosa das questões.
Em face de estatísticas mostrando que, inesperadamente, as demissões são mais frequentes quando o crescimento econômico é maior, os autores concluem que existem incentivos para que o trabalhador force ou negocie sua demissão. Daí porque elas aumentariam quando a economia está aquecida e a obtenção de uma nova vaga parece mais fácil.
Hoje, argumentam, a demissão é a oportunidade tanto de liberar o FGTS quanto de receber, na Justiça, direitos às vezes não-pagos. Só que a alta rotatividade da mão-de-obra (38% dos empregos duram menos de um ano) reduz os investimentos em treinamento. E a baixa qualificação diminui a produtividade e os salários reais.
Daí que os autores propõem que o saque do FGTS seja desvinculado da demissão, e que a legislação transfira maior poder para a negociação direta entre sindicatos e empresas, evitando o recurso excessivo à Justiça do Trabalho.
André Urani constata que, nos anos 80 e início dos 90, as políticas recessivas tinham maior êxito em melhorar a balança comercial do que em conter a inflação, pois a economia estava indexada.
Rogério Valle apresenta uma pesquisa sobre o comportamento estratégico das empresas e, além de outras constatações, também conclui que os reduzidos treinamentos e a baixa qualificação estão entre as principais distorções.
Vale notar que, além das consequências negativas da rotatividade excessiva, outros dados também contradizem o pressuposto, de alguns dos próprios autores, de que a flexibilidade do mercado de trabalho é necessariamente positiva.
Paes de Barros e Mendonça mostram que, entre 12 países industrializados, o mercado de trabalho mais rígido é o da Coréia do Sul, justamente a nação que registra o melhor desempenho econômico.

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