São Paulo, sábado, 10 de agosto de 1996 |
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José Antônio da Silva dizia-se 'um fenômeno, um gênio' Pintor primitivista participou da Bienal de Veneza OLÍVIO TAVARES DE ARAÚJO
No universo dos artistas primitivos brasileiros -tão cheio de contrafações inexpressivas-, ele foi, no mínimo, um vigoroso inventor de formas, escapando intuitivamente, e graças apenas ao talento, às muitas armadilhas para quem pinta campos e vaquinhas. Silva nasceu em 1908 nos arredores de Sales Oliveira, no interior de São Paulo, e passou a infância e a adolescência em colônias e fazendas. Contava que numa episódica ida à cidade, levando uma carreta carregada de latões de leite, viu um pintor fazendo santos e anjinhos na parede da matriz, e o observou durante horas, de cócoras, encantado. Pode ser verdade, pode ser apenas a tentativa de fabricação de mito do talento precoce. Mas é fato que passou a desenhar incansavelmente em caixas de papelão, paredes e até pedras. Aos 21 anos, casou-se e foi morar em São José do Rio preto. Empregou-se como guarda noturno de um hotel e ganhava um dinheiro extra pintando os túmulos do cemitério da cidade. Em 1946, José Antônio da Silva mandou seus primeiros quadros para um salão com que se inauguraria a Casa de Cultura de Rio Preto; ganhou, surpreendido, o primeiro prêmio, 1 cento de réis. Na comissão julgadora estavam críticos de primeiríssima importância, como Lourival Gomes Machado e Paulo Mendes de Almeida. Este (muito ligado ao modernismo dos anos 30, em São Paulo) foi quem o incentivou a fazer sua primeira individual, em 1948. Seguiu-se uma carreira meteórica. Na década de 50, Silva já era aceito regularmente nas bienais de São Paulo -o que é muito significativo, tratando-se de um espaço de apoio às vanguardas-, e por duas vezes integrou a representação brasileira à Bienal de Veneza. Quando da realização de sua última grande retrospectiva, mais uma vez ficou tudo claro. Por "primitivo" Silva só podia ser chamado no sentido mais nobre da palavra: um ser psicológica e esteticamente intocado, mas nada rudimentar, dono de um universo próprio, e capaz de espontaneamente expressá-lo através de tintas e pincéis. Não tinha nenhum dos cacoetes dos pintores "ingênuos" ou naifs, não era deliquescente, não fazia céus com nuvenzinhas de algodão nem figurinhas alambicadas. Tinha, pelo contrário, um pathos muito intenso, um mundo interior até dramático, que se infiltrava sob a falsa aparência da simplicidade. Nos anos 50 -talvez o seu ápice-, Silva o liberava em cenas de queimadas, em campos amplos, em ossadas, em figuras e crucifixões, era em cores sombrias, ora tão variadas e intensas quanto as de uma pintura de expressionismo alemão (que ele, evidentemente, não conhecia). Não é sem motivo que José Antônio da Silva se tornou um "cult" entre os exigentes colecionadores de Volpi, por exemplo. Embora opostos, no resto, ambos são artistas originais -o que é uma raridade, no país. Texto Anterior: Grã-Bretanha traz Gary Hume à Bienal Próximo Texto: Tunga terá grande mostra em NY Índice |
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