São Paulo, quarta-feira, 14 de agosto de 1996
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Insegurança leva mães a criar 'código'

BETINA BERNARDES
DA REPORTAGEM LOCAL

A apreensão gerada pelos problemas de segurança na cidade de São Paulo levou à criação de um "código de mães".
Trata-se de uma rede de informações envolvendo telefones, bips e celulares.
O objetivo é verificar se a segurança dos filhos está garantida e tranquilizar as mães que ficam em casa "com o coração na mão", enquanto os jovens se divertem nas saídas noturnas.
"Amo as segundas, terças e quartas-feiras, mas, quando chega a quinta, começa a me dar aquela coisa. Na sexta-feira, quando os mais velhos saem, já não durmo mais", diz a dona-de-casa Cleusa Deliacoli, 43.
Cleusa tem três filhos: Marlon, 13, Fabian, 19, e Audrey, 22. "Não tenho como proibi-los de sair, eles são jovens, mas a gente sabe que nenhum lugar é seguro", explica.
Ela cita como exemplo a morte de um amigo de Fabian numa discussão, há cerca de um mês, na Confraria da Cerveja (zona leste).
"O pai de uma menina sacou a arma e matou o amigo do meu filho. Isso dentro de um bar de bom nível. Não tem como deixar de ficar preocupada", diz.
Para aliviar a tensão, Cleusa faz parte das chamadas "mães da madrugada", um grupo que se liga durante a noite para saber se os filhos chegaram e estão bem.
Às vezes, elas nem se conhecem, mas criam códigos. Quando o filho de uma chega, ela rapidamente liga para a outra mãe, deixa o telefone tocar duas vezes e desliga.
"A gente nem precisa atender, já sabe que os dois toques significam que tudo está bem", diz Cleusa.
Outro método é acionar os filhos pelo bip ou celular para saber como vão as coisas.
"É meio ridículo, mas é tudo fruto da insegurança. Dói muito ter filho jovem em dia. Na minha geração, não havia tanta preocupação com violência", lamenta.
A dona-de-casa Vasthi Sotelo, 44, diz que também morre de medo, quando o filho, de 15 anos, sai.
"Não posso colocá-lo numa redoma de vidro, mas tento estabelecer limites de horário", diz. Seu filho foi assaltado três meses atrás.
"Infelizmente, os governantes esquecem suas promessas de campanha depois que chegam ao poder e não levam a sério a questão da violência."
O comerciante Murilo Salem, 51, tem uma filha de 12 anos. Ela ainda não começou a sair à noite, mas ele já teme pelo que pode acontecer quando a menina for mais velha.
"Estou apavorado. Tenho preparado minha filha para aprender a se virar sozinha, mas sei que vou enfrentar um problema quando isso acontecer", afirma.
Salem pretende se mudar para uma cidade menor. "A violência é decorrente do descontrole desta megalópole, não vejo saídas."

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