São Paulo, domingo, 18 de agosto de 1996
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Polícia ágil é receita para qualquer país

GILBERTO DIMENSTEIN
DE NOVA YORK

Responsável pela queda da criminalidade na cidade de Nova York, William Bratton se transformou no policial mais famoso do mundo. Nessa entrevista à Folha, ele aconselha os brasileiros a não acreditar em quem diz que as ruas só ficarão seguras quando a sociedade for rica, com trabalhadores ganhando altos salários e sem desemprego. "Sei que os brasileiros, principalmente dos grandes centros, se sentem derrotados, impotentes diante do crime. Mas aprendi em Nova York que uma boa e respeitada polícia inibe os criminosos."
Folha - A experiência de Nova York serve para São Paulo ou Rio de Janeiro?
William Bratton - Há obviamente diferenças e elas têm de ser consideradas. Não temos tantos mendigos ou crianças de rua nem tantos esquadrões da morte protegidos pela omissão policial. Pelas informações de que disponho, a imagem da polícia americana é melhor. Mas existe algo que aprendi e de que estou absolutamente convencido. Uma polícia respeitada pela população, eficiente, ágil, inibe o crime. Isso serve para qualquer lugar.
Folha - Pobreza provoca violência?
bratton - O problema social obviamente interfere. Mas não é determinante como muitos estudiosos tentam fazer crer. Tive a curiosidade de levantar as taxas de criminalidade nos Estados Unidos durante o período de Depressão, um dos momentos mais graves socialmente na história deste país, com milhões de desempregados. A taxa de criminalidade e violência era muito, muito mesmo, menor do que hoje, quando a riqueza é bem maior. A Índia é mais pobre do que o Brasil ou os EUA, mas a criminalidade, segundo os dados de que disponho, não é tão alta.
Folha - Então, o que provoca violência?
Bratton - Um dos fatores que considero decisivo é a sensação de impunidade, a sensação de que a cidade não tem controle contra a desordem. Por isso, é importante que os policiais sejam visíveis nas ruas. O policiamento preventivo é o melhor policiamento porque evita a violência antes que ocorra. Uma de nossas primeiras medidas foi contratar mais policiais. Eu fui criado num bairro de Boston onde havia muitos pobres. Mas sabíamos que uma má conduta seria punida, e as famílias exerciam controle, pressionavam, portanto havia um sentido comunitário.
Folha - Nova York passava a sensação de desordem?
Bratton - As pessoas ficavam na rua bêbadas, provocando, agressivas, incomodando os cidadãos. Por todos os lados, grafitavam tranquilamente, mendigos agiam também agressivamente. Esses detalhes passavam a sensação de que não havia lei, não havia ordem, e se podia fazer qualquer coisa. Portanto, resolvemos atacar os pequenos delitos e, assim, tentar evitar os grandes crimes. Muitas vezes, ao pegarmos um indivíduo bêbado, víamos que estava armado e era parte de uma quadrilha.
Folha - Violência é uma doença que vai crescendo?
Bratton - Tenho a impressão de que sim. A violência e criminalidade devem ser atacadas assim como atacamos um corpo com antibióticos. A tendência natural é ela ir crescendo. Nunca se vai acabar com o crime, mas pode ser mantido sob controle. A sociedade vai ter de dizer se ela quer que o crime seja o HIV, o vírus da Aids, que destrói o sistema imunológico da sociedade, ou se vai ser diabetes, doença que deve ser tratada diariamente, mas está sob controle.
Folha - Devido à desesperança, falta de convicção na polícia ou Judiciário, muitos brasileiros tendem a se omitir ou até estimular execuções de esquadrões da morte ou arbitrariedades policiais. Como vê essa tendência?
Bratton - A resposta violenta é mais uma parte do problema. Nova York mostra que se pode combater o crime dentro de um sistema democrático, respeitando todos os direitos individuais. E quando o policial sai da linha, deve ser punido. Volto a insistir que uma polícia respeitada é uma polícia eficiente.

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