São Paulo, domingo, 18 de agosto de 1996
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A qualidade total na saúde

LUÍS NASSIF

O Sistema Único de Saúde (SUS), no Brasil, é um modelo quase completo de planejamento da saúde. A cultura do SUS está impregnada de alguns princípios cívicos fundamentais.
O quase que falta ao SUS é transformar o compromisso com a qualidade e a eficiência em valor intrínseco ao modelo.
Nesse contexto, é fundamental que se confira o que está ocorrendo na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre (RS).
Administrada por uma irmandade, a Santa Casa recebe R$ 65 milhões por ano do SUS. O Hospital das Clínicas local (considerado instituição eficiente) recebe R$ 122 milhões. Na Santa Casa atendem-se duas vezes mais doentes do que no HC.
De cada R$ 100,00 que gasta com pacientes do SUS, a Santa Casa recebe apenas R$ 70,00 de reembolso. Mesmo assim, consegue financiar o restante com serviços para terceiros -como convênios médicos e seguros-saúde.
Até abril de 94, o tempo médio de espera para a marcação de consultas era de 13 horas. Em maio de 94, apenas um mês depois, baixou para 9 minutos e 6 segundos. Em julho de 95, para 8 minutos e 12 segundos.
Mesmo sem o luxo de um Albert Einstein, a Santa Casa exibe o mesmo padrão de limpeza e organização, que lhe permite concorrer com os hospitais privados na atração de convênios e seguros-saúde. A ponto de prever um aumento do faturamento com convênios de R$ 17 milhões no ano passado, para R$ 33 milhões este ano.
PBQP
A semente dessa virada situa-se em 90, com o lançamento do Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade (PBQP) -provavelmente o evento de maior impacto na história econômica recente do país.
Por intermédio de um fornecedor -a Johnson & Johnson-, a Santa Casa ouviu falar de um novo método gerencial, a Gerência pela Qualidade Total (ou TQC), criado no Japão, trazido para o Brasil pela Fundação Cristiano Ottoni, de Belo Horizonte, e disseminada pelo PBQP.
Em 92, um grupo de 20 pessoas da Santa Casa -liderado pelo médico João Polanczyk, um filho de poloneses dotado de organização e vontade férrea- foi até a fundação conhecer os detalhes do programa. Na volta, o programa foi implantado. Em pouco tempo, os resultados foram estrondosos.
O segredo do programa de qualidade é mudar o foco da análise para o cliente. Empresa com qualidade é aquela que atende da melhor maneira possível as demandas de sua clientela. Trata-se de um evidente exercício de cidadania.
O que a Santa Casa fez foi ouvir seus clientes, para identificar os problemas. Depois, buscar as soluções, de acordo com a metodologia desenvolvida pelo TQC.
Finalmente, subdividir a Santa Casa em 80 unidades e ensinar a cada qual como identificar os problemas, criar seus indicadores e aprimorar seus processos. É um treinamento que começa pelas chefias e se espraia por todos os funcionários até que se consolide como valor cultural da organização.
No primeiro semestre de 94, consolidado o TQC, a Santa Casa decidiu jogar o método num plano estratégico.
Cada área passou a gerenciar suas próprias rotinas e a criar indicadores de acompanhamento de desempenho.
Antes, havia tendência de culpar as pessoas pelo mau desempenho. Depois da aplicação do TQC, constatou-se que 85% das causas estavam em processos mal formulados. Padronizando os processos, os problemas deixaram de existir.
Fórmula para o SUS
De que maneira o modelo da Santa Casa de Porto Alegre poderia se estender para todo o SUS? Não há mistérios na fórmula proposta por João Polanczyk.
A municipalização do SUS é o primeiro passo. Depois, cada município estabelece seus próprios padrões e os controles do processo de trabalho. Caberá ao Ministério da Saúde, por intermédio das Comissões de Saúde, homogeneizar os padrões, permitindo a comparação entre ambos, e preparar multiplicadores para levar os conceitos de qualidade total para toda a rede conveniada.
TQC na Educação
O mesmo programa de Qualidade Total foi o responsável pela revolução no ensino público em Minas Gerais.

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