São Paulo, domingo, 18 de agosto de 1996
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Bienal tem roteiros para todos os gostos

IRINEU FRANCO PERPETUO
FREE-LANCE PARA A FOLHA

São 881 expositores, distribuídos em 248 estandes, ao longo de 43 mil m2, recebendo um milhão e meio de visitantes. A Bienal Internacional do Livro de São Paulo é a terceira maior feira de livros do mundo.
Percorrer todos os três pavilhões do Expo Center Norte é tarefa cansativa. Mesmo tendo 12 horas por dia para fazê-lo (das 10h às 22h) e uma semana inteira (o evento acaba domingo que vem, dia 25).
Está certo que existe uma área de alimentação e sete áreas de descanso. Por outro lado, é proibido fumar, e, para quem não tem carro ou não mora na Zona Norte, a mudança da Bienal do Ibirapuera para o Expo Center Norte tornou o acesso mais demorado.
Para aqueles 57% que, segundo o Datafolha, não abriram nem um livrinho nos últimos 12 meses, tirar o atraso agora vai ser complicado. Os títulos expostos são 152 mil, de 22 países, e, mesmo que você queira se concentrar só nos lançamentos, sobram ainda 3 mil -suficientes para uns bons 10 anos de leitura, desde que você consiga manter a invejável média de um livro por dia.
Econômico
Se, em termos de ofertas, a Bienal ainda está longe de ser uma Fenasoft, é possível fazer compras bastante vantajosas. Principalmente, no pavilhão vermelho.
A grande barganha acontece no estande 118, da L&PM. As biografias de compositores da série "The New Groove" (Beethoven, Stravinski e Wagner, entre outros) estão custando R$ 4,00 -a metade do preço que se paga em livrarias.
Pelo mesmo preço, a Livraria Italiana (est. 94) oferece os livros da coleção "Spiralotti della Buona Cucina" (Fabbri Editori). Títulos mais óbvios como "Le Salse" (As saladas) e "Le Torte della Nonna" (As tortas da vovó) convivem com um inusitado "La Cucina Giapponese" (A Cozinha Japonesa).
O estande da Grã-Bretanha (172) traz os clássicos da Penguim Books a R$ 3,00. A oferta é vasta, destacando "Dubliners", de James Joyce, "Drácula", de Bram Stoker, e "Frankenstein", de Mary Shelley, entre outros.
Vale lembrar, entretanto, que já é possível ter clássicos em português -todos a bom preço, no pavilhão azul: R$ 3,00 é o preço dos primeiros 25 volumes da "Coleção Leitura", da Paz e Terra (est. 75) -que traz autores como Baudelaire, Shakespeare, Celso Furtado e Antonio Candido, entre outros.
Esta também é a linha da coleção "Minibooks", da Ediouro (est. 55), na qual, por módicos R$ 1,80, é possível adquirir obras de Machado de Assis, Vinícius de Moraes, Nelson Rodrigues e Rubem Fonseca.
Nacional
Intencionalmente ou não, o hype de Bienal é o escritor nacional. Após décadas na estrada, autores como Carlos Heitor Cony ("O Piano e a Orquestra", Companhia das Letras, R$ 22,00, est. 69) e Ferreira Gullar ("Gamação", Global, est. 66) parecem ter sofrido uma súbita valorização por parte das editoras.
O que facilita muito é que praticamente todo mundo que interessa está no pavilhão azul, aquele que abriga as maiores editoras brasileiras.
Crème de la crème é a poesia: além de Manoel de Barros ("Livro sobre o Nada", Record, 85 págs., R$ 15,00, est. 13) saem inéditos de Cecília Meireles ("Oratório de Santa Maria Egipcíaca", 80 págs., R$ 9,00, e "Poemas Chineses", editora Nova Fronteira, 116 páginas, R$ 13,00, est. 35).
Ainda no estande da Nova Fronteira, vale conferir a "Antologia dos Poetas Brasileiros", organizada por ninguém menos que Manuel Bandeira. No mesmo estande, há ainda as "Obras Completas", de Olavo Bilac (Nova Aguilar, 1.080 págs., R$ 67,00) e, sem sair do pavilhão azul, no estande 66, "Melhores Poemas de Paulo Leminski" (Global, 220 págs., R$ 19,90).
Estrangeiro
Dá para conferir grandes nomes estrangeiros em sua língua pátria, como Lezama Lima ("Poesia Completa", Cuba, est. 221, pavilhão verde, R$ 25,00) e Octávio Paz (o Fondo de Cultura Económica, do México -pavilhão vermelho, est. 161- traz do volume 2 ao 6 das obras completas do autor).
A Companhia das Letras (pavilhão azul, est. 69) lança "Firma", do israelense Amós Oz (296 págs., R$ 27,00). Outros livros do autor estão disponíveis no estande de Israel (pavilhão vermelho, est. 152). Ainda no pavilhão azul, há as escritoras inglesas do século passado: Jane Austen ("Emma", Nova Fronteira, est. 35, 368 págs., R$ 21,00) e Charlotte Bronte ("Jane Eyre", Paz e Terra, est. 75, R$ 40,00).
Lusitano
Portugal tem, no pavilhão azul, o estande 48, o maior da Bienal, com 480 m2, abarcando 12 editoras.
É possível, ainda no pavilhão azul, encontrar boa literatura portuguesa na Nova Fronteira (est. 35), que lança "A Criação do Mundo", de Miguel Torga (1907-1995).
Ainda de Maxwell, é possível achar, no estande da Grã-Bretanha (172, pavilhão vermelho), "The Making of Portuguese Democracy" (Cambridge University Press).
Erudito
Há pouquíssimas novidades, ambas da autoria de compositores: a habitualmente generosa Jorge Zahar lança "Poética Musical", de Igor Stravinski, enquanto a Edusp traz "Música Eletroacústica", de Flô Menezes.
Também é lançamento uma biografia cujo interesse certamente deve transcender o estrito círculo da música de concertos: "Maria Callas - A Mulher por Trás do Mito", de Ariana Stassinopoulos (Companhia das Letras, est. 69, pavilhão azul, 400 páginas, R$ 36,00).
Frequentadores da irmãos Vitale podem se decepcionar com seu estande na Bienal. A ênfase é toda em música popular, com songbooks do new age Yanni, da cantora Barbra Streisand e da banda Air Supply.
Apesar do centenário de morte de Carlos Gomes, ninguém se animou em lançar novidades sobre o compositor campineiro. A Secretaria Estadual de Cultura relança a biografia "Carlos Gomes - Do Sonho à Conquista", de Juvenal Fernandes. Também em relançamento está a rica coletânea "Carlos Gomes - Uma Obra em Foco" (Funarte, R$ 20,00) e o desatualizado "Carlos Gomes - Uma Discografia", de Sérgio Nepomuceno (Unicamp, R$ 20,00).
No estande da Funarte, estão disponíveis ainda as partituras -em redução para canto e piano- das óperas da fase italiana do compositor, por R$ 13,00 cada.
O lançamento mais recente -e mais simpático- acaba sendo o volume "O Guarani" da série "Ópera para Crianças", da Editora Callis -boa opção para começar a educar a criançada.
E a única maneira de levar CDs para casa é adquirir, da Paulus, "Música na Sé de São Paulo Colonial", de Régis Duprat (R$ 45,00) -sobre o mestre de capela da Sé de São Paulo no início do século passado, André da Silva Gomes, que inclui gravações suas.
Lúdico
Quem se cansar de ver tanto livro pode participar das inúmeras atividades que as editoras estarão oferecendo. Como as sessões de origami que Carlos Gênova dá na Rideel (est. 111, pavilhão vermelho).
Gilberto Milos, hexacampeão brasileiro de xadrez, joga na editora Planeta aos sábados, das 18h às 22h, e domingos, das 16h às 22h. No estande, ainda é possível travar conhecimento com o livro "Xadrez & Xadrezão", de Sérgio Borges (R$ 19,90), em que o autor apresenta o "xadrezão" como uma variante intergalática do xadrez (terráqueos combatem ETs, com peças como discos voadores e submarinos) e tabuleiro de 10x10 casas (e não 8x8, como no xadrez tradicional).
No estande de Portugal, o Instituto Camões apresenta a exposição de fotos preto-e-branco "Novos Viajantes", retratando ex-possessões portuguesas: Moçambique, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e, é claro, Brasil.
Dia 24, às 16h, o apresentador Sergio Groissman traz o estilo do seu "Programa Livre" para o estande da Atual Editora, onde entrevista os escritores da Coleção Passando a Limpo.
Contra a corrente
Uma peregrinação ao estande de Cuba (est. 221, pavilhão verde) é obrigatória aos adversários do neoliberalismo. Mas o ecletismo pode assustar membros da velha guarda do partido. Obras do setentão Fidel Castro e seu mentor José Marti convivem pacificamente com trabalhos sobre hipnose, orixás, beisebol, gastronomia e computação.
Nada parecido, entretanto, com o choque que se leva no estande da Bertrand (pavilhão vermelho, est. 95), onde "A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado", de Engels (R$ 20,00), é colocado literalmente ao lado de "Reencarnação - A Esperança do Universo", de Irving S. Cooper (Difel, R$ 7,50).
A salvação, felizmente, não fica muito longe: no estande 165, do Fondo de Cultura Económica, os três volumes em castelhano de "O Capital", de Marx, saem por R$ 75,00.
Mas a meca do dissenso é mesmo a Brasiliense (est. 110, de um pavilhão que não poderia ser mais vermelho). Lá é possível adquirir "O Filho do Brasil - de Luís Inácio a Lula", "Um Governo de Esquerda para Todos", de Paul Singer (R$ 18,70) e "Uma veia de Utopia - a Trajetória de Luiza Erundina", de Linda Bimbi (R$ 15,00), para cujo lançamento, às 18h do dia 21, está prevista a presença da candidata do PT à prefeitura.
Esportivo
Início de Brasileirão significa luxúria futebolística na Melhoramentos (est. 38, pavilhão azul). "Corinthians - Paixão e Glória" (Juca Kfouri), "Palmeiras - Eterna Academia" (Alberto Helena Jr.) e "São Paulo F.C. - Saga de um Campeão" (Ignacio de Loyola Brandão): é escolher e vestir a camisa (aliás, por que será que o Santos ficou de fora?).
Setenta fotos do Galinho de Quintino permeiam as 128 páginas de "Zico Conta sua História" - autobiografia do ex-jogador do Flamengo com orelhas escritas por seu ex-colega de seleção brasileira, Sócrates (FTD, est. 18, pavilhão azul). De quebra, Zico autografa o livro dia 24, às 19h.
A Disal (est. 92, pavilhão vermelho) traz biografias -importadas e cheias de fotos coloridas- de ídolos do basquete profissional norte-americano, editadas pela Magna Books: "Michael Jordan" (R$ 20,69), "Shaq - The Making of a Legend" (sobre o pivô Shaquille O'Neal -R$ 23,65) e "The Kings of The Court - Legends of the NBA" (Os Reis da Quadra - Lendas da NBA -R$ 14,80).
Místico
O pavilhão vermelho da Bienal foi particularmente tocado pela espiritualidade. É a área das edições Paulinas, da Federação Espírita de São Paulo e da União das Sociedades Espíritas de São Paulo. O estande 141, dos Hare Krishna, traz em sua decoração um portal de madeira do século 16.
Cheiro de insenso impregna a atmosfera. Imagens em bronze de Ganesha (o deus da prosperidade) convivem com gravuras de Krishna e receitas de bolos sem ovos (R$ 10,00).
Conjunção de forças cósmicas ou capricho do acaso, o estande Krishna fica ao lado de duas editoras especialmente dedicadas a livros cristãos: a Paulus e a Ave Maria.
Pertinho está a Seicho-no-iê, que, por sua vez, fica ao lado da Federação Israelita, cuja principal atração é um CD-ROM da "Bíblia" (em inglês e hebraico, R$ 70,00). Israel traz ainda uma urna em que as crianças devem depositar mensagens de paz, para serem levadas ao Muro das Lamentações, em Jerusalém. E é possível ter aulas de história do povo judeu com um grupo teatral, em um cenário com réplicas das seis portas de Jerusalém.
Não é tudo. Próximo ao estande israelense está o da Sociedade Bíblica do Brasil, que destaca o lançamento infantil "Onde Está o Juquinha?" -uma versão bíblica do sucesso infantil "Onde Está Wally?", com dois volumes (R$ 9,50 cada), ambientados no velho e no novo testamento.
Tietagem
O ecletismo é a marca das sessões de autógrafos da Bienal. Sintomaticamente, hoje estão agendados o mineiro Fernando Sabino ("De Cabeça Para Baixo", Record, est. 13, pavilhão azul, 15h) e, lá do outro lado da Bienal, no pavilhão vermelho, o ator Jece Valadão ("Memórias de um Cafajeste", Geração, est. 139, 18h).
Hoje também é dia do campeão de vendas Paulo Coelho autografar "O Monte Cinco" (Objetiva, pavilhão azul, est. 52).
Adeptos da "tietagem pop" podem conferir as sessões de José Wilker ("Como Deixar um Relógio Emocionado", Scritta, dia 19, 19h, est. 71) e Rita Lee ("Rita Lyrica", Melhoramentos, dia 24, 16h, est. 24).
Já a turma da "tietagem cabeça" certamente vai preferir Jacó Guinsburg ("Aventuras de Uma Língua Errante", Perspectiva, dia 19, 20h, est. 152) e François Chesnais ("A Mundialização do Capital", Xamã, dia 24, 18h, est. 110).

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