São Paulo, domingo, 18 de agosto de 1996
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O exército de miseráveis

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - É óbvio que todos os movimentos da sociedade civil destinados a tentar melhorar a qualidade de vida são saudáveis. É o caso dos Reage Rio, Ribeirão Preto e São Paulo.
Mas o êxito desses movimentos vai depender de que não mirem apenas alvos instantâneos, no caso a reação à violência urbana.
É preciso que tenham como objetivo também atacar causas mais profundas, como a miséria e sua irmã siamesa, a obscena concentração de renda.
O Índice de Desenvolvimento Humano, preparado pelas Nações Unidas, aponta a existência, só no Rio e São Paulo, de 8,9 milhões de pessoas vivendo com, no máximo, meio salário mínimo mensal.
Com esses números, o que deveria surpreender é menos o grau selvagem de violência já atingido e mais o fato de que a selvageria não seja ainda maior.
O governo e a sociedade deveriam condecorar, com a mais alta distinção da República, todos aqueles que fazem trabalhos pesados por salários levíssimos. São heróis.
Ganhariam muito mais e trabalhariam muito menos se passassem a prestar serviço ao crime organizado. Basta lembrar que cálculos recentes indicam que só a "indústria do sequestro", no Rio, movimenta algo em torno de R$ 1 bilhão/ano.
É ingênuo supor que uma melhora, ainda que substancial, na distribuição de renda vá resolver o problema, magicamente. Mas é fechar os olhos à realidade ignorar que países com níveis mais equânimes de distribuição de renda têm bem menos problemas de violência em suas cidades.
Enquanto o país continuar produzindo miseráveis em grande escala estará fornecendo à violência um formidável exército de mão-de-obra disponível. É óbvio, mas, no Brasil, o óbvio tem que ser repetido à exaustão.

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