São Paulo, domingo, 25 de agosto de 1996
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A OEA e os desafios contemporâneos

ITAMAR FRANCO

No princípio do século passado, quando a maioria das nações do continente americano ainda lutava para alcançar a independência política das metrópoles européias, começou a forjar-se um sentimento de solidariedade continental, fundado na convicção de que a conquista da liberdade exigia uma ação solidária na defesa da aspiração comum.
As idéias de San Martin e Bolívar conquistaram o novo mundo hispânico. Entre nós, destaca-se a figura de Tiradentes como o grande precursor desses ideais. Na esteira dessa evolução histórica, já no final daquele século, realizou-se em Washington uma conferência intercontinental que viria a ensejar a criação da União Internacional das Repúblicas Americanas, primeira entidade de caráter supranacional a congregar países de uma mesma região do globo terrestre, tendo por objetivo a cooperação política.
Nas décadas que se seguiram, o mundo vivenciou conflitos bélicos de proporções nunca dantes vistas. Era portanto natural que, ao término da Segunda Grande Guerra, surgisse um clamor geral em prol da paz e da segurança. As Américas não ficaram imunes aos movimentos e aspirações da época.
Assim é que, em 1948, era assinada em Bogotá a Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA), organismo que viria a suceder a União Internacional das Repúblicas Americanas e cuja finalidade principal seria assegurar a preservação da paz, da liberdade, dos direitos humanos e da democracia.
As instituições são criadas para atender às necessidades humanas, devendo submeter-se a um constante processo de adaptação, de sorte a responder às expectativas e anseios do momento presente. Assim se deu em relação à OEA. Ao longo dos anos, foi-se reconhecendo que os valores liberdade, democracia e paz só tinham sentido quando entendidos numa acepção mais ampla, quando vinculados à construção de uma sociedade justa e próspera.
A liberdade dos excluídos não é idêntica à dos afortunados; a paz para os oprimidos não significa apenas a manutenção da lei e da ordem; a democracia nas regiões menos favorecidas pressupõe a conquista do bem-estar para todos; os direitos humanos das populações marginalizadas têm, também, um conteúdo social que transcende o ideário neoliberal.
Na trilha desta linha de pensamento, foram levadas a termo duas importantes reformas da Carta da OEA ao longo da presente década. Em 1992, era assinado em Washington protocolo alterando o capítulo que define os propósitos da entidade para incluir entre estes a "erradicação da pobreza crítica", por tratar-se de condição necessária "ao pleno desenvolvimento democrático dos povos do hemisfério".
Esse mesmo documento proclama que o combate à pobreza "é parte essencial da promoção e consolidação da democracia representativa e constitui responsabilidade comum e compartilhada dos Estados americanos". Em 1993, os Estados membros subscreveram o Protocolo de Manágua, criando o Conselho Interamericano de Desenvolvimento Integral, órgão vinculado à Assembléia Geral da OEA que tem por finalidade promover a cooperação nos campos econômico, social, educacional, cultural, científico e tecnológico.
O momento histórico que se avizinha para a Organização dos Estados Americanos é promissor. Há um amplo consenso quanto à imperiosa necessidade de caminharmos no sentido da edificação de uma maior solidariedade para alcançarmos padrões de vida mais dignos para todos.
Compreende-se que a segurança e a estabilidade só serão alcançadas quando vencermos a batalha contra a penúria, a fome e a degradação ambiental e social, que desafortunadamente atingem milhões de seres humanos. Os mais bem aquinhoados sabem que a repressão e a força das armas não podem construir a paz duradoura. Às razões éticas soma-se o interesse concreto e pragmático em superar a dualidade social, o distanciamento entre ricos e pobresgmático em superar a dualidade social, o distanciamento entre ricos e pobres.
A nossa constituição em 1988 inscreveu, entre os princípios fundamentais do relacionamento externo brasileiro, " a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando a formação de uma comunidade latino-americana das nações".
Cabe ao nosso país usar o foro da OEA para trabalhar, em conjunto com os nossos irmãos da América, no sentido da universalização dos direitos ao trabalho com salário digno, educação, saúde, moradia, segurança e, sobretudo, pela democratização das relações econômicas e financeiras internacionais, pressuposto básico para a construção de um mundo melhor.

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