São Paulo, terça-feira, 27 de agosto de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Bancos, agricultura e newcucarachos

ALOYSIO BIONDI

É cada vez mais ostensiva a opção do governo FHC de privilegiar os lucros dos bancos, contra os interesses do restante de toda a sociedade: empresários, agricultores, classe média e povão. Veja-se a revelação que, em julho, o Banco Central emprestou nada menos de R$ 4,6 bilhões aos bancos, a juros de pai para filho.
Atenção: são empréstimos não aos bancos que precisam de "socorro", mas aos bancos que já vêm apresentando lucros fabulosos também neste ano. Para que a dinheirama? Para os bancos aplicarem a juros maiores, e terem lucros também maiores.
O surpreendente é que a "pepineira" não foi implantada em sigilo, não: há algumas semanas, o Banco Central anunciou oficialmente a nova invenção dos economistas/banqueiros da equipe FHC/BNDES, representada por mudanças no sistema de redesconto.
Mais surpreendente ainda é que, talvez pelo hábito de silenciar de forma bovinamente suicida, ninguém protestou: nem empresários, nem sindicalistas, nem povão nem classe média. Aparentemente, não se entendeu o que se escondia por detrás do economês, e não se percebeu que os lucros dos bancos não iam sair do nada: toda a sociedade teria parte de sua renda transferida para os bancos.
Sem mágica
Foi o que aconteceu em julho. O Banco Central emitiu aquele R$ 1,6 bilhão para entregar aos banqueiros. Depois, como as teorias dizem que mais dinheiro em circulação provoca inflação, o governo FHC vendeu R$ 3 bilhões em títulos para trazer o dinheiro de volta aos seus cofres. Isto é, aumentou sua dívida interna (em títulos) e vai pagar juros de uns 30% ao ano aos compradores dos títulos.
Na brincadeira, o BC e o Tesouro Nacional (isto é, toda a sociedade, nós) vão pagar a diferença entre as taxas cobradas dos bancos e aquelas pagas aos compradores dos papéis.
É esse o preço de aumentar os lucros dos bancos. Enquanto as empresas quebram, os trabalhadores ficam desempregados, a agricultura é massacrada por "falta de recursos", a equipe FHC/BNDES emite e cria novo privilégio para os bancos.
Funcionários
O governo negou o reajuste de 20% aos funcionários federais. Ele significaria despesas de mais R$ 600 milhões por mês. Ou R$ 3,6 bilhões por semestre. Os banqueiros receberam mais que isso. Em um mês.
Agricultores
Para financiar o plantio das safras do próximo ano, mais as despesas para comprar as colheitas, quanto a equipe FHC/BNDES destinou? De recursos do Tesouro? Nada. Nem um tostão. De outras fontes (Banco do Brasil, FAT etc.)? Algo como R$ 5 bilhões. Tanto quanto os bancos receberam. Em um mês.
Lembrete
Desde janeiro, contrariando as análises cor-de-rosa sobre a possibilidade de recuperação da economia, esta coluna vem prevendo o agravamento da recessão, "quebradeira" e volta do rombo na balança comercial.
Adeus, Vale
As reservas minerais da Vale do Rio Doce são avaliadas em R$ 40 bilhões. A equipe FHC/BNDES vai "privatizá-la" vendendo por apenas R$ 4 bilhões, ou um décimo do valor, as ações que garantem o controle da empresa.
Honestidade
A venda da Vale envolve mais uma manobra que a sociedade ainda não entendeu. O governo planeja criar outra empresa para controlar a Vale. Isto é, um grupo, com gastos modestos, passaria a ser dono de fato. A Vale mudaria de nome. O novo nome? Sem rubor: Newcompany. Em inglês.
Sugestão
Quando chegar o momento de mudar o nome do Brasil, o colunista tem uma sugestão: Newcucaracha. Os líderes empresariais, políticos e formadores de opinião que vêm apoiando as barbaridades cometidas pelo governo FHC/BNDES vão adorar sua nova nacionalidade: newcucarachos.

Texto Anterior: "Independence Day"
Próximo Texto: Deve surgir banco do Oriente Médio
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.