São Paulo, quarta-feira, 28 de agosto de 1996
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A violência em São Paulo

HÉLIO BICUDO

A cidade de São Paulo, em especial seus bairros da periferia, tem sido palco de inúmeros homicídios, com a eliminação, por vezes, de famílias inteiras, homens, mulheres e crianças. São mortos como animais num abatedouro.
Os responsáveis pela segurança pública limitam-se a afirmar, no costumeiro diapasão, que se ouvia desde os tempos do "esquadrão da morte", que se trata do resultado de confrontos de quadrilhas, embora se possa visualizar nesses fatos a participação da própria polícia.
Medidas adequadas, entretanto, não são adotadas.
Agora, a violência começa a alcançar os bairros mais nobres da cidade, e as vítimas não são os miseráveis da periferia -ora, quem se importa com eles-, mas pessoas da classe média alta.
Daí ser possível que surjam, porque a classe média ainda tem voz, algumas providências úteis. Mas advirta-se que não bastam providências para sustar a violência nos Jardins e adjacências, mas medidas que devam ser estendidas ao município como um todo, pois, diz a Constituição, a segurança é um dever do Estado e direito de todos, ricos ou pobres.
No Estado de São Paulo, o policiamento ostensivo/preventivo se faz pela PM, com um efetivo aproximado de 70 mil homens. Mas isso não quer dizer que os 35 milhões de habitantes se beneficiem desse contingente de policiais.
Se considerarmos as horas efetivamente trabalhadas, os policiais afastados por atos de violência flagrante, aqueles que exercem a vigilância dos presídios, os que se encontram em férias ou afastados para tratamento de saúde, os que prestam serviços em outros setores da administração e os que exercem atividades burocráticas, São Paulo está sendo policiado, num dado instante, por um número insignificante de policiais que, provavelmente, não alcança a casa dos 15 mil.
Isso quer dizer que temos um policial para cada dois mil e poucos habitantes, o que é considerado absolutamente insuficiente pelos índices internacionais aconselhados pela experiência internacional.
O que fazer?
Em primeiro lugar, não mais podemos conviver com duas polícias, cujas despesas com material se duplicam: a PM, com quartéis, unidades autônomas, viaturas, comunicações independentes e pessoal burocrático, e quase os mesmos meios para a Polícia Civil.
Isto, além dos naturais conflitos e atribuições entre as duas corporações. Não seria, portanto, mais racional termos uma só polícia, sob um só comando, com um segmento uniformizado para a prevenção, e uma polícia em trajes civis para a investigação?
É evidente que essa polícia seria disciplinada, mesmo porque não se poderia admitir coisa diferente quando se trata de uma corporação de homens armados. Com isso, estariam liberados recursos financeiros de montante considerável para o recrutamento e reaparelhamento da polícia.
Em segundo lugar, para o curto prazo, diante do crescimento do desemprego, com levas de trabalhadores ingressando em perigosa ociosidade, sem perspectivas de ganhos salariais, uma política inteligente poderia, rapidamente, aumentar o número de policiais, inclusive com a liberação daqueles que não estão exercendo propriamente funções policiais para que o façam.
Acrescente-se, em remate, que o policiamento só pode ter êxito se contar com patrulheiros a pé, policiando sempre a mesma área as 24 horas do dia, para que sejam conhecidos e conheçam os membros da comunidade. Visitas às moradias, às casas comerciais, às escolas para avaliar onde se encontram os nichos da violência a serem debelados. Enfim, restabelecer o que desapareceu desde há tanto tempo: a confiança popular na polícia.
Esse policiamento deverá contar com o apoio de viaturas, chamadas a intervir nos momentos adequados, pois o policiamento com viaturas por si só nada ou quase nada acrescenta, por ser sincopado. Sua função é a de dar cobertura ao policiamento a pé.
Como se vê, não é impossível enfrentar o problema. Resta querer, ter vontade política para fazê-lo, sobretudo, sem considerações aos normais corporativismos dos órgãos, que não ajudam, mas, como sabemos, sobremaneira, atrapalham.

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