São Paulo, sexta-feira, 30 de agosto de 1996
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Em busca da verdade

ANTÔNIO DE SALVO

Na intensa repercussão que a pesquisa sobre assentamentos da reforma agrária gerou, uma questão acabou ficando meio encoberta e é importante retirá-la da sombra para colocá-la em uma posição mais central: o que o país está fazendo pelas famílias que não foram assentadas pelo Incra, mas já vivem na terra e da terra?
O projeto de reforma agrária do governo ocupa tempo, dinheiro e espaço, levando os moradores das cidades, justamente preocupados com a solução dos problemas nacionais, a achar que, para o campo, a única solução é a reforma agrária nos termos em que está sendo proposta pelo governo.
Impossibilitados de ter uma visão mais ampla do problema, porque examinam a conjuntura nacional com uma visão compreensivelmente urbana, os milhões de brasileiros bem-intencionados que vivem nas cidades custam a perceber onde está o erro fundamental, a grande contradição que acaba por tornar o projeto de reforma agrária do governo uma falácia sem consequência social e econômica relevante.
O erro fundamental está em complicar a vida de quem já produz em propriedades rurais, desestimulando a tal ponto a agricultura e a pecuária, o que praticamente impede a viabilidade econômica e social dessas propriedades rurais, ao mesmo tempo em que anuncia, como panacéia universal, a criação de pequenas propriedades rurais sem tecnologia, sem infra-estrutura e -vimos agora na pesquisa da Vox Populi- sem futuro.
Ou seja, o mesmo governo que pretende solucionar problemas sociais e econômicos instalando famílias em lotes rurais cria uma quantidade tão formidável de obstáculos para aqueles que já têm atividades rurais, que o observador mais atento fica em dúvida se isso ocorre por desconhecimento puro e simples da realidade.
Não basta, porém, levantar a voz, içar bandeiras e dar cores ainda mais emocionais a um debate por si só apaixonado e apaixonante: é preciso adicionar racionalidade a este debate.
E essa é a tarefa de cidadania: por isso patrocinamos essa pesquisa e iremos patrocinar outras, como nossa parte no esforço, que deve ser coletivo, de buscarmos soluções nacionais caminhando sobre uma base de informação sólida e desapaixonada.
Não há, nessa postura, a negação da necessidade de uma reordenação fundiária. As distorções existentes, nos extremos da dimensão das propriedades, precisam ser corrigidas.
O latifúndio ocioso só encontra paralelo no sentido do anti-social no minifúndio gerador da pobreza sem futuro. Buscar soluções para essas questões faz parte de nossos deveres e tem que ser praticado ao arbítrio da razão e não do preconceito.
É óbvio que a Confederação Nacional da Agricultura organiza sua agenda a partir de postulações políticas, da mesma forma como o fazem todas as entidades representativas. O que nós não permitimos, contudo, é que as informações a partir das quais formularemos nossa estratégia sejam incompletas, distorcidas ou irreais.
Isso porque não podemos cometer os mesmos erros que comete quem parte de informações ultrapassadas para buscar soluções obsoletas.

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