São Paulo, sábado, 31 de agosto de 1996
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Seriedade para o Proálcool

LUCIANO ZICA

Nos dias 11, 12 e 13 de junho a frente parlamentar sucroalcooleira promoveu, na Câmara dos Deputados, o seminário internacional "O Álcool e a Nova Ordem Econômica Mundial", ocasião em que foram abordados os aspectos relacionados ao uso do álcool etílico (etanol) como combustível.
Na oportunidade tivemos painéis, apresentados por autoridades federais e estaduais da área de energia dos Estados Unidos e representantes de entidades ligadas à produção e tecnologia do etanol, em que foram enfocados o lado estratégico da produção interna do etanol, que reduz a dependência do petróleo importado; o balanço positivo da emissão de CO2 amenizando o efeito estufa e a geração de empregos, fundamental no atual modelo de globalização que está sendo imposto à sociedade.
Essas posições, também defendidas pelo representante da Suécia, reforçaram nossa convicção de que o etanol, como combustível automotivo, é positivo para a qualidade de vida da população.
Esse esforço está sendo positivo em vista de projetos-pilotos bem-sucedidos em veículos pesados de duas das mais tradicionais indústrias de caminhões que na sequência darão sustentação ao crescimento da produção de etanol.
Os americanos também não fazem só discurso -já produzem atualmente 6 bilhões de litros anualmente e esperam aumentar a produção para 7,5 bilhões de litros nos próximos dois anos.
E, no Brasil, o que estamos fazendo? O país possui uma experiência jamais vista em outra parte do planeta no uso de biomassa como combustível automotivo, mas que por falta de "timing" e uma visão míope de diversos agentes não nos permite um horizonte para o planejamento da dimensão que o álcool deve ter.
Acreditamos que não é mais relevante a necessidade da venda institucional de um programa de álcool, pois foi demonstrado que este está aceito pela sociedade. O fundamental é discutir a viabilização da existência do álcool para que a sociedade possa usufruir de seus benefícios em maior escala.
Concluída a crítica etapa de abastecimento do mercado, ao final da safra 1995/96 da região centro-sul do país, com todos os desconfortos e medidas de última hora, qual foi a experiência absorvida? Podemos responder que nenhuma, em consequência das ações que vêm sendo adotadas pelo governo.
Essas ações são praticamente a repetição de todo o processo conflituoso ocorrido na safra passada, em que destacamos o atraso na publicação do plano de safra, a continuidade da prática ilegal de abastecer o mercado de álcool anidro do Rio Grande do Sul com MTBE e a manutenção das importações de uma mistura de álcoois que dá prejuízo financeiro ao país e não substitui o álcool anidro de nacional.
A demanda de álcool no período da safra 96/97 é estimada em 4,6 milhões de metros cúbicos de álcool anidro e 9,65 milhões de metros cúbicos de álcool hidratado, que, confrontado com a produção indicada no plano de safra, resulta na insuficiência de 550 mil e 660 mil metros cúbicos de álcool anidro e hidratado, respectivamente.
O plano de safra estabelece que a insuficiência de álcool hidratado será complementada com 700 mil metros cúbicos de metanol, e sutilmente, ao não tratar da complementação do álcool anidro, informa que a demanda total será complementada com 560 mil metros cúbicos de álcool proveniente do mercado externo.
Concluímos que toda essa importação será de álcool anidro.
Entendemos, portanto, que essa redação sutil provavelmente está relacionada com o descumprimento da lei nº 8.723, de 28/10/93, que determina que o álcool a ser adicionado à gasolina deve ser do tipo etílico, ou etanol, condição não atendida pelo álcool importado, que só atende as especificações de uma portaria do Departamento Nacional de Combustíveis, que autoriza a adição de butanol, propanol e outros álcoois à gasolina.
O nosso compromisso com o álcool nacional se deve ao fato de que só este gera os empregos e produz a riqueza para o país que justifiquem os subsídios alocados a esse produto.
O álcool anidro importado, além de ilegal, não produz o mesmo teor de oxigênio que o etanol, o que equivale dizer que 22% desse álcool equivale a 18% do álcool nacional. Por que então não adequar a legislação e reduzir a mistura do álcool nacional para 20%, quando a produção for insuficiente?
Acrescente-se ainda que as importações geram custos adicionais de subsídios, quando comparadas com alternativas mais econômica e tecnicamente adequadas, da ordem de US$ 250 por metro cúbico, que no volume de 560 mil metros cúbicos representam aproximadamente US$ 140 milhões.
Recursos que, se aplicados na redução dos juros dos financiamentos ao setor sucroalcooleiro, produziriam um benefício mais uniforme para os produtores.
O que falta ao álcool não é tecnologia ou recursos. O que falta é seriedade na administração da oferta e da demanda e racionalidade no equacionamento do déficit da produção de álcool do mercado interno, quando elas ocorrerem.

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