São Paulo, sábado, 31 de agosto de 1996
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Momento de mobilização social

ANTONIO CLAUDIO MARIZ DE OLIVEIRA

A questão posta proporciona desdobramentos que merecem uma acurada reflexão, que antecede a sua própria análise. Adolescentes e mesmo crianças praticam, atualmente, infrações bárbaras, deixando-nos perplexos e estarrecidos pela crueldade e malvadez que os caracterizam. A diminuição da faixa etária dos criminosos violentos é um dado real.
Agindo isoladamente ou em grupos comandados por maiores, nossas crianças e nossos jovens estão demonstrando uma insensibilidade assustadora e um desapego incompreensível pela vida alheia e até pela própria. Sim, pela própria, pois se colocam frente ao crime de forma desabrida, inconsequente, mostrando um destemor irracional.
Assusta a prática de atos de violência e de crueldade absolutamente desmotivados, desprovidos de qualquer sentido, mesmo dentro da ótica do delinquente, pois, após imobilizar a vítima e se apossar de seus bens, provoca-lhe um mal físico desnecessário para alcançar os seus objetivos, já atingidos.
Com tais características, a criminalidade infanto-juvenil está a merecer reflexões sérias e aprofundadas e que extrapolam os limites da questão jurídica e das soluções legislativas de natureza meramente repressiva para situar-se num campo mais amplo e diversificado que possibilite uma análise global do problema.
Sem a pretensão de realizar tal análise, mas apenas para situar a questão dentro de parâmetros consentâneos com a realidade, entendo imprescindível que a sociedade, especialmente as elites, se coloque como partícipe da angustiante situação e não como sua mera espectadora ou vítima.
Na verdade, a sociedade, de um modo geral, se preocupa com os menores porque eles estão assaltando. Estivessem quietos, amargando calados e inertes suas carências e misérias, continuariam esquecidos e excluídos.
Nossas crianças estão crescendo abandonadas, desnutridas, sem afeto, sem teto, sem saúde, sem educação, exploradas e convivendo diuturnamente com a violência.
Embora tardia, chegou a hora de fazermos algo mais do que clamar por punição. Que seja esta a oportunidade de uma mobilização social tendente a tirar as crianças da rua, dando-lhes o que nunca tiveram. Aqueles que não se sentem responsáveis e solidários devem agir pelo menos em nome do sentimento de autopreservação...
No entanto é preciso também que não fiquemos com a venda da hipocrisia a tampar os nossos olhos. A internação dos menores autores de infrações graves é um imperativo não só de defesa social, mas de uma política de recuperação dos mesmos. É preciso que eles sintam a presença da lei, como resposta da sociedade à sua conduta, que pelo fato só da menoridade não pode permanecer impune.

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