São Paulo, quarta-feira, 4 de setembro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

1997: um Orçamento melhor

FABIO GIAMBIAGI

Em 15 de outubro do ano passado publicamos nesta Folha um artigo sobre o Orçamento Geral da União (OGU) de 1996, defendendo-o diante das críticas feitas por aqueles que não queriam aprová-lo. Era, na verdade, uma tentativa de esclarecimento de alguns mal-entendidos surgidos no contexto do debate parlamentar da época.
Sem prejuízo da validade de nenhum dos esclarecimentos dados na ocasião, cabe reconhecer, entretanto, que aquele Orçamento ainda estava longe do ideal. Apesar disso, parece-nos que o OGU-96 foi melhor do que o OGU-95, que, por sua vez, foi melhor do que o OGU-94 -pelo simples motivo que este último, elaborado em 1993, da mesma forma que todos os orçamentos feitos nominalmente em um contexto de alta inflação, não passou de uma peça de ficção.
Os dois principais aspectos pelos quais o OGU-96 pode ser considerado um aperfeiçoamento em relação à versão do ano anterior são:
1) A intenção de ajuste implícita no mesmo, já que em 1994 o OGU-95 foi encaminhado ao Congresso já com déficit extremamente alto.
2) A definição prévia das dotações a serem cortadas em caso de frustração de receita, diminuindo a margem de arbítrio do Executivo no momento de decidir os cortes.
Por outro lado, o OGU-96 apresentou os seguintes problemas:
a) A possibilidade de não ser aprovado por tempo indefinido, a ponto de, de fato, a sua aprovação se deu vários meses depois do início do ano.
b) A superestimação da inflação futura, associada à grande variância das taxas de inflação esperada, no contexto de uma estabilização incipiente e com uma taxa de inflação anual -na época em que o OGU foi preparado- da ordem de 30%, o que conduziu a uma superestimação da receita.
c) A inclusão de fontes duvidosas de receita, como a CPMF -prevista, na ocasião, já para 1996-, o que, apesar da explicitação dos recursos a serem cortados em caso de não-aprovação dos novos impostos, tornava o resultado da despesa também incerto.
d) A decisão do Executivo, de aceitar uma série de demandas, traduzidas em uma dotação orçada para a variável "Outras despesas Correntes e de Capital" (OCC), muito superior ao valor efetivamente liberado dessa variável em 1995. Portanto, em relação, especificamente, a esta rubrica -correspondente às "demais despesas", excetuados os gastos com juros, pessoal, benefícios previdenciários e transferências vinculadas-, continuou a prevalecer um indesejável grau de arbítrio do Executivo na definição dos cortes.
Em outras palavras, o grau de transparência do Orçamento aumentou, "ma non troppo", no sentido de que parte da despesa tinha valores irrealistas.
Parodiando Didi, para quem "treino é treino, jogo é jogo", dir-se-ia que o "jogo" fiscal se dá no dia-a-dia da liberação ou não-liberação dos recursos por parte da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e não na definição do OGU -um "treino", de acordo com a analogia-, prática essa que contraria a transparência que deve caracterizar a discussão e aprovação do Orçamento.
O OGU-97 apresenta as seguintes mudanças em relação a esse quadro:
a) A existência de uma regra que, no caso de não-aprovação do Orçamento, paralisa o governo depois de 31 de março, o que tende a provocar a votação do mesmo até essa data, acabando com os atrasos tradicionais na votação de matéria tão importante -já tivemos situações surrealistas de orçamentos aprovados quase no fim do ano ao qual se referiam.
b) A adoção de um parâmetro de inflação futura de 10%, sujeito a uma margem de erro muito menor do que a que caracterizou o OGU-96.
c) A inclusão, na receita, apenas dos impostos já existentes, sem qualquer previsão associada a impostos "virtuais" (não aprovados ainda).
d) A definição de um valor realista da OCC.
A vantagem do novo Orçamento é que o montante a ser liberado deverá se aproximar do aprovado, acabando com a situação na qual vota-se um Orçamento irrealista com previsão de despesa de 100, da qual o governo só libera, por exemplo, 50. O OGU-97 ainda sofre de um problema importante: a existência de um déficit fiscal de certa expressão (1,1% do PIB).
Havendo déficit, porém, é melhor explicitá-lo e ter uma discussão séria acerca de onde gastar cada real, ao invés de fazer de conta que não existe, aprovando um Orçamento que tem, formalmente, um equilíbrio no qual ninguém acredita.
Em resumo, a melhoria de qualidade do Orçamento deve ser vista como um processo gradual, no qual cada ano é produzido um OGU melhor do que o anterior.
A meta deve ser um equilíbrio confiável entre receita e despesa -de preferência, com o corte desta- e uma correlação próxima de 1 entre os valores orçados e aqueles de fato liberados pela STN.
Conforme dito acima, o OGU-97 é um aperfeiçoamento em relação ao OGU-96, mas ainda não atingirá o ideal. Um objeto realista a ser perseguido, então, é preparar o OGU-98 com déficit menor do que o de 1997, para finalmente "zerar" o déficit em 1999 ou em 2000.

Texto Anterior: Câmbio e política
Próximo Texto: Indicadores estão em alta nos EUA
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.