São Paulo, quinta-feira, 5 de setembro de 1996
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Pacto tenta tirar crianças do trabalho

Governo lança programa amanhã

CLÓVIS ROSSI
DO CONSELHO EDITORIAL

O governo federal rendeu-se a uma intensa pressão de entidades da sociedade civil e lança amanhã, no Palácio do Planalto, o "Pacto Nacional contra o Trabalho Infantil".
Trata-se de um conjunto de três documentos, todos com o mesmo objetivo: eliminar o trabalho infantil em todas as etapas da cadeia de produção. Hoje, segundo o governo, 16,9% das crianças brasileiras entre 10 e 14 anos já trabalham.
O principal documento é um protocolo de intenções que envolve não apenas o governo federal e os estaduais, mas também confederações patronais e de trabalhadores e entidades da sociedade civil, no esforço para "definir estratégias de ação" para atingir o objetivo do pacto.
Renda x trabalho
Traduzindo: trata-se de suplementar a renda da família de forma a permitir que a transferência das crianças do trabalho para a escola não provoque queda no rendimento familiar, que fatalmente levaria à volta da utilização de mão-de-obra infantil.
Para chegar ao pacto, a Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança, sua principal patrocinadora, percorreu um longo caminho. Começou por um levantamento dos setores industriais que utilizam produtos cuja elaboração, em algum momento, passa pelo uso de mão-de-obra infantil.
Descobriu, por exemplo, que as minas de carvão -que vira ferro-gusa e, depois, peça de veículos- empregam grande número de crianças. As montadoras de automóveis, todas multinacionais, foram as primeiras a assinar compromissos de erradicar esse tipo de trabalho forçado, temendo a repercussão que uma denúncia do gênero teria em suas matrizes.
Depois, a Fundação Abrinq obteve compromissos idênticos das indústrias de suco de laranja e dos fabricantes de calçados de Franca (401 km a norte de SP).
Álcool, o último
O grande obstáculo para se chegar a um pacto abrangente era o próprio governo. A Petrobrás, empresa estatal, é a única compradora do álcool produzido a partir de cana-de-açúcar, colhida também, em parte, pelas crianças.
A primeira tentativa de convencimento do governo esbarrou na alegação de que o governo não podia prescindir dos votos de parlamentares que ou eram eles próprios usineiros de açúcar ou, então, eram financiados por estes.
Por meio de pressão aberta ou pelo diálogo, a campanha finalmente dobrou o governo. Tanto que os dois outros documentos do pacto dizem respeito especificamente ao setor sucroalcooleiro.
Um deles obriga o setor a destinar parte dos recursos do Plano de Assistência Social para suplementar a renda dos trabalhadores, de forma a permitir que seus filhos não deixem a escola.
O outro cria o Grupo Executivo de Repressão ao Trabalho Forçado, que coordenará ações de vários ministérios para eliminar o trabalho infantil no setor.

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