São Paulo, quinta-feira, 5 de setembro de 1996
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Clinton cria problemas futuros

Sucesso é apenas 'eleitoreiro'

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

Pelo menos no curto prazo, os ataques dos EUA contra o Iraque são um grande sucesso para o presidente Bill Clinton.
Ele mostrou que é capaz de usar a força militar do país quando necessário, neutralizou as críticas que seu adversário na eleição de novembro lhe vinha fazendo num assunto sensível para ele (a liderança militar) e aumentou ainda mais suas chances de se reeleger.
Mas a ação militar desta semana não resolveu nenhum dos problemas estratégicos dos Estados Unidos no Oriente Médio, enfraqueceu as já difíceis relações do país com a França e criou novos pontos de atrito entre ele e seus instáveis aliados árabes.
Bom marketing, pouca força Embora tenha sido bem vendida para a complacente (pelo menos quando se trata de questões de patriotismo) opinião pública norte-americana, a operação militar não demonstrou tanta força quanto desejaria Clinton.
Os EUA não puderam agir no norte do Iraque, onde a agressão do governo de Saddam Hussein contra os curdos aconteceu, porque os riscos de baixas seriam grandes, e as complicações diplomáticas, ainda maiores.
Ao se concentrar no sul, Clinton resolveu enfatizar seu compromisso com a Arábia Saudita, mas nem assim obteve autorização dela para usar na missão aviões baseados em seu território.
Quando o fervor nacionalista espairecer um pouco, as análises vão mostrar que durante dois anos o governo Clinton menosprezou os problemas provocados pela rivalidade entre dois partidos políticos dos curdos no Iraque.
Os ataques desta semana definiram a posição norte-americana de apoio a um deles, a União Patriótica do Curdistão, que é sustentada pelo Irã, o arquiinimigo histórico dos Estados Unidos.
As ações de Clinton também colocam em risco o importante apoio que a Turquia, integrante da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), tem dado aos EUA. Agora sob governo islâmico, a Turquia pode se afastar dos EUA.
Os líderes da Jordânia e do Egito também ficaram contrariados com o ataque dos EUA ao Iraque e, pressionados pela presença no poder em Israel de um ultraconservador, poderão também se distanciar da política de alinhamento quase total com os EUA que vinham seguindo há anos.
Com tantos problemas de longo prazo criados por essa operação, é difícil deixar de se concluir que ela foi decidida com objetivos de política doméstica.
Bob Dole mostrou que estava decidido a tocar no ponto nervoso de Clinton, sua fragilidade como líder militar, apesar da secular tradição política do país de que este é assunto proibido em campanhas eleitorais e em situações de crise internacional. O vilão habitual, Saddam Hussein, o salvou.

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