São Paulo, sábado, 14 de setembro de 1996
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O mundo contemporâneo

OSCAR DIAS CORRÊA

Ives Gandra Martins, após haver realizado obra admirável no campo do direito, de outras ciências sociais, da filosofia e da poesia; não contente com as atividades inumeráveis que desenvolve, e que alcançam todo o amplo arco do conhecimento humano; não satisfeito de frequentar os certames de debates jurídico-econômico-sociais; e, mais, de dizer o que pensamos, no jornal do dia, sobre o tema da hora, dá-nos agora "Uma Visão do Mundo Contemporâneo", em volume-síntese, de menos de 200 páginas, tratando de todos os temas cruciais deste fim de século e milênio e das interrogações angustiantes que nos formulamos, sem resposta razoável.
É sobre esse mundo de "contrastes e confrontos" que Ives Gandra exerce o seu poder de análise e crítica e, fundado na amplitude de seu campo de conhecimentos e na sua "Weltanschauung", indica os elementos que fazem do futuro o enigma que o homem não consegue decifrar e que, segundo ele, o devorará.
Todos os temas (e não os enumeraremos, se o índice do volume, por si só, os propõe), todos os grandes problemas que o mundo enfrenta, ou que Ives antevê vai defrontar, merecem-lhe o estudo, sem preocupação doutoral, ou de erudição, em linguagem enxuta, medida, simples, escorreita, constituindo-se, assim, em visão realista (se não pessimista) do fim deste segundo milênio e albores do terceiro.
E se Ives parece ter razão em tudo, ou quase tudo, nossa conclusão finalíssima diverge: ele quer ser realista e, para isso, não esconde os rigores da análise que o levam ao pessimismo, muitas vezes; e eu, embora tudo indique um mundo atribulado no futuro, aposto no meu anjo da guarda (que sempre, aliás, teve trabalhos centuplicados!) e que me induz a dizer que podemos acreditar no homem: apesar de tudo, apalpando, tateando, tropeçando e levantando, destruindo e criando, vendo e sonhando, sofrendo e aprendendo, vai, lenta, lentissimamente (para o meu gosto!), buscando a felicidade e a paz, que, supremo anseio, nunca esmaece e, menos ainda, morre.
Ives, crente em Deus, não há de descrer da Sua mais nobre criatura, que, afinal, por caminhos nem sempre certos, acaba tendendo, indesviavelmente, para o Criador, por mais o ofenda, por mais tente amesquinhá-lo, esquecê-lo e, até, igualar-se a Ele.
O quadro que Ives apresenta é o resultado do seu convívio com o mundo, e como esse convívio se faz cada vez mais difícil para os que crêem nos valores éticos permanentes, nos quais fomos, ele e eu, nascidos e criados, a visão há de ser marcada pelos reflexos negativos disso que, antes que convívio, é confronto.
Mas tanto Ives acredita na salvação do Homem e do mundo que, quanto ao Brasil, analisa-lhe os problemas, aponta soluções, aconselha, confia; e sua lição merece ser meditada, porque só objetiva o feliz encontro do futuro.
Para nós, brasileiros, é, sobretudo, um privilégio ver alguém que, como Ives Gandra Martins, tem o direito de analisar, com tanta liberdade, conhecimento e proficiência, a nossa realidade, acima de paixões e interesses, cidadão que honra a cidadania, estudioso que dignifica o debate, espírito cívico que engrandece o país.

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