São Paulo, sábado, 14 de setembro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O preço da obsessão

GUIDO MANTEGA

Tão logo forem abertas as urnas das eleições municipais em novembro próximo, uma nova discussão promete ocupar a paciência e a agenda política do país nos próximos meses.
Por iniciativa do próprio Palácio do Planalto, correm soltas articulações em torno da aprovação da emenda constitucional para a reeleição do presidente da República e prometem sobrepujar a reforma político-partidária, a reforma fiscal, a reforma da Previdência, a discussão do Orçamento 97 e outras questões seguramente mais importantes para o conjunto da população.
Nem mesmo o acerto das contas públicas, que não andam bem das pernas, parece sensibilizar tanto o governo. Muito pelo contrário. Ao que tudo indica, o controle do déficit público e as novas etapas do programa de estabilização serão sacrificadas no sagrado altar da reeleição presidencial.
De pouco têm adiantado as advertências, até de ilustres consultores internacionais, quanto ao descontrole do déficit público e à dívida mobiliária, que cresce mais do que os candidatos governistas nas pesquisas de opinião.
Mesmo a balança comercial, sabidamente o calcanhar-de-aquiles de planos com âncora cambial, caminha para um déficit perigoso entre US$ 2 bilhões e US$ 3 bilhões em 1996. Entretanto, obcecado pela idéia de ficar mais seis anos vestindo a faixa presidencial, Fernando Henrique Cardoso está determinado a embarcar nessa aventura, mesmo à custa de um desequilíbrio maior das contas públicas.
Isso significa que o governo não vai negar ajuda financeira aos vinte e poucos governadores, que hoje formam o maior clube de endividados do país.
Nesta semana, alguns deles ensaiaram uma "conspiração branca" contra o Ministério da Fazenda. Afinal de contas, são eles a segunda maior força política do país e também os principais responsáveis pelo déficit operacional de mais de 3%, que já se desenha nas contas de 1996. São donos também de R$ 40 bilhões de dívida mobiliária, que mais cedo ou mais tarde acabará "absorvida" pelos cofres federais.
Mas os nobres deputados não devem se afligir com o apetite dos governadores. Vem aí uma reforma ministerial que vai distribuir cargos e verbas para os aliados e um Orçamento 97 repleto de emendas. Portanto não serão apenas os rumos da estabilização que serão afetados com as articulações para a reeleição, mas também o Orçamento 97.
O ex-governador Newton Cardoso, que recentemente jantou com o presidente, diz que negociou um "pacote" completo, recheado de ministérios, cargos e até a presidência da Câmara. Pelo andar da carruagem, está se armando mais um triste espetáculo de fisiologismo explícito nos bastidores do Palácio do Planalto.

Texto Anterior: Inflação baixa, crescimento medíocre
Próximo Texto: Código de ética; Campanhas políticas; Dia da Imprensa; Descoberta; Cinema brasileiro; Mediocridade
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.