São Paulo, sexta-feira, 27 de setembro de 1996
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O ajuste da Villares

CELSO PINTO

A ação PN das Indústrias Villares deu um salto espetacular este ano, de 310%, o que a colocou como a mais rentável entre as 286 empresas cotadas na Bolsa de São Paulo. No mesmo período, o índice Ibovespa subiu 51%.
Por trás deste desempenho, está a conclusão de um longo processo de ajuste, iniciado na década de 80, e que havia tornado a mesma Villares um dos maiores "micos" do mercado acionário da última década. Segundo dados da Economática, a ação da Villares chegou a valer, em dólares, US$ 11,24 em 1986. Seis anos depois, em 1992, ela havia caído para US$ 0,04. Em 10 anos, em dólares, a ação da Villares despencou 90%. Ainda hoje, uma ação vale US$ 0,58.
A história da virada da Villares é interessante em mais de um aspecto. A Villares é um daqueles grupos nacionais eleitos pela política industrial dos governos militares para criar um setor de bens de capital no país, com ajuda de financiamentos públicos a preço camarada e proteção tarifária.
Foi bom enquanto a festa durou. Quando a crise da dívida complicou o modelo de proteção industrial, os investimentos na área de bens de capital (e de processamento de dados) quase levaram o grupo à bancarrota. O grupo vendeu vários negócios, num longo e penoso processo de reestruturação. Em janeiro de 95, a Acesita comprou 31% do capital, e a Sul América, 20%, ficando, juntas, com mais ações do que os 32,6% de Paulo Villares, pelos dados da Economática.
O grupo se concentrou em dois negócios, aço e elevadores, mas o endividamento era tão grande que impedia a decolagem da empresa (as ações subiram desde 92, mas com tropeços). Foi o processo de reestruturação financeira, iniciado em janeiro deste ano e completado ontem, que explica a reviravolta no preço das ações este ano.
Como a situação da Villares não é única no universo de empresas brasileiras, vale a pena contar a última etapa em detalhes. A holding do grupo tinha uma divisão que era a Elevadores Atlas, e controlava outra empresa, a Aços Villares.
A holding tinha uma dívida próxima a R$ 190 milhões, que era o caroço a resolver. A primeira etapa da engenharia financeira, feita com ajuda do ING Barings, foi em janeiro deste ano, ao transformar a divisão Atlas numa empresa separada, com R$ 40 milhões de capital, integralmente controlada pela holding.
Em seguida, a Elevadores Atlas comprou por R$ 90 milhões a carteira de manutenção de elevadores da holding. Manutenção parece algo secundário, mas é o coração do negócio: 65% da receita da Elevadores Atlas vem do serviço de manutenção de elevadores, não da venda ou fabricação de elevadores.
Para pagar os R$ 90 milhões, a Elevadores Atlas, uma empresa nova e portanto sem dívidas, tomou um empréstimo no mercado interno de R$ 75 milhões. O custo, evidentemente, foi alto.
Em junho, a Atlas lançou um eurobônus no mercado internacional de US$ 75 milhões, usando o dinheiro para liquidar o empréstimo interno mais caro. Finalmente, a última etapa foi concluída ontem, com a venda de R$ 72,6 milhões em ações da Elevadores Atlas que estavam nas mãos da holding (na Villares Mecânica S.A. e na Villares Control S.A.). A holding continuará com 74% do capital da Atlas.
A colocação foi feita toda em ações no Brasil, para manter uma boa liquidez, mas cerca de 60% foi comprado por investidores institucionais externos, através do formato legal do Anexo IV. Com isso, a holding embolsará o dinheiro e reduzirá seu endividamento a cerca de R$ 15 milhões, um valor administrável.
Nem tudo são rosas. O mercado não gosta muito de holdings, nem da existência de "partes beneficiárias" para 10% dos acionistas (que garante os ganhos mesmo que eles não acompanhem eventuais aumentos de capital), lembra Pedro Eberle, da Dynamo. O fato, contudo, é que o preço que o mercado aceitou pagar por ação equivale a um valor de R$ 275 milhões para a empresa, cujo valor patrimonial é R$ 50 milhões.
A Villares é uma fração do que foi, mas encontrou um caminho. Pergunta: teria sido melhor ter feito um pacote de subsídios oficiais para "salvar" o grupo?

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