São Paulo, sexta-feira, 27 de setembro de 1996
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O PERIGO MORA EM MIAMI

Em um país no qual ressurreições políticas não são nada incomuns, convém sempre estar alerta para personalidades que parecem relegadas ao ostracismo.
É o caso do ex-presidente Fernando Collor de Mello, recolhido ao exílio dourado em Miami.
Dos políticos brasileiros contemporâneos, Fernando Collor é, provavelmente, o que tem maior sentido de oportunidade (ou de oportunismo, se se preferir).
Seu recolhimento parece obedecer à estratégia de deixar decantar a memória de seu governo, para que fique à tona apenas o lado eventualmente positivo e se esqueça o negativo.
Por positivo entenda-se o fato de ter tomado a iniciativa de modernizar a agenda do país, introduzindo nela temas como a abertura econômica e a ênfase nas privatizações.
É bom lembrar que modernizar a agenda não é sinônimo de modernizar o país propriamente dito. Para ficar em um só ponto, Collor entregou o governo com a inflação de novo em alta assustadora (foi de 980%, pelo INPC, no ano de 1992), depois de ter fracassado o famoso "um tiro só" para matá-la. E, como é óbvio, não há modernidade com inflação alta.
Mas o mais grave é que o Collor modernizante na teoria econômica foi arcaico nas práticas políticas e administrativas, não apenas como presidente, mas como também prefeito de Maceió e governador de Alagoas. Foi, como governador, o responsável por um indecoroso acordo com os usineiros do Estado, que até hoje sangra o erário local.
No exercício da Presidência, sua obra maior foi a falta de decoro, motivo pelo qual foi afastado do cargo pelo tribunal que as instituições prevêem para julgar presidentes, qual seja o Congresso Nacional.
Seria um erro político imperdoável tratar de separar o Collor da agenda modernizante do Collor das práticas arcaicas e inaceitáveis, como se se pudesse condecorar o dr. Jekyll e condenar mr. Hyde, os personagens do livro "O Médico e o Monstro".

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