São Paulo, sábado, 28 de setembro de 1996
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A paz precisa ser salva

JAIME PINSKY

O sangue que está correndo sobre os tratados de paz celebrados entre israelenses e palestinos vinha sendo temido por todos os que, de alguma forma, se opuseram à eleição de "Bibi" Netanyahu para primeiro-ministro de Israel.
De fato, após anos de idas e vindas, parecia que, finalmente, com Rabin e Peres de um lado e Iasser Arafat de outro, o estado de beligerância seria substituído pelo de convivência, e a desconfiança daria vez à tolerância. A morte de Rabin tinha quase o significado de sacrifício ritual, de encerramento do trabalho dos generais e guerrilheiros e início da labuta dos pavimentadores de uma aceitação mútua.
A história, contudo, foi escrita de forma bem diferente. Velhas paranóias, muito marketing em cima do produto "Bibi", um mau desempenho de Peres na mídia, algumas incursões suicidas do Hamas, uma boa pitada de fundamentalismo e concepções ultrapassadas de um nacionalismo estreito elegeram uma figura lamentável que se vangloriava, tolamente, de não se dispor a estreitar a mão de Arafat.
A esperança era, como sempre, a de que a prática do governante fosse diferente do discurso do candidato. Parece que, nas primeiras semanas, "Bibi" até que tentou segurar seus radicais, com Sharon à frente. Entretanto, refém de suas promessas, acabou criando a situação que coloca hoje, em campos opostos, aliados de ontem.
Na verdade, "Bibi" estimula a reelaboração de um inimigo externo em busca da coesão interna, utilizando-se da mesma e velha metodologia tantas vezes empregada ao longo da história contra os próprios judeus. Satanizar os palestinos, a pretexto de manter fronteiras seguras, é totalmente irracional, principalmente se tratando de um país com apenas 20 ou 30 quilômetros de largura em alguns trechos. A única fronteira segura é a pacífica.
A paz está ameaçada? Claro que sim, se se considerar ingredientes como um governo nacionalista, um povo humilhado, ódios à flor da pele e vários governos árabes vizinhos temerosos que uma paz estável entre dois povos cultos e universalistas, como israelenses e palestinos, possa comprometer estruturas semifeudais ainda vigentes na região. Não falta quem forneça armamento nem quem ajude a puxar o gatilho.
Por outro lado, metade de Israel votou contra "Bibi", e mesmo parte dos que votaram nele talvez já estejam arrependidos da besteira que fizeram. Cabe aos cidadãos israelenses conscientes e antifundamentalistas sair às ruas contra a política suicida atualmente posta em prática pelo governo e, num segundo momento, junto com os palestinos lúcidos e progressistas, garantir a paz na região.

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