São Paulo, sexta-feira, 3 de janeiro de 1997 |
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Disputar a São Silvestre às 15h é insuportável
SILENE COUTO
Há quatro anos, exatamente no dia 1º de janeiro de 1993, escrevi uma carta à organização da prova solicitando a mudança de horário da prova masculina. Na ocasião, as mulheres pediram em coro, por mim regido, o seguinte: "Mudem o horário". Inconformada com a resposta negativa da organização para a mudança, resolvi fazer minha inscrição no feminino, mas correr às 17h, com o pelotão masculino. É simplesmente insuportável correr às 15h, pois, pelo horário de verão, estamos correndo, na verdade, com o sol das 14h. O desgaste é enorme porque o asfalto está fervendo. Quase não há sombras nem brisa. Como atleta, eu já experimentei diversas situações difíceis em provas de pistas e ruas e posso afirmar que a pior experiência é a corrida das 15h da São Silvestre. À medida que nós corremos, sentimos nosso corpo se consumindo e os músculos cada vez mais cansados. A vontade é parar após completar quatro ou cinto quilômetros. Mas nós passamos o ano inteiro correndo, competindo e, quando chega dezembro, queremos celebrar, festejar e participar da confraternização mais importante do Brasil. Não podemos esquecer que a São Silvestre é feita de várias subidas em viadutos e ruas que ficam completamente esquecidas em função da avenida Brigadeiro Luiz Antônio. É evidente que ali o atleta já percorreu 13 km e tem que buscar energia e condições para os últimos 2 km de subida. Dizer que só a Brigadeiro é difícil é tapar o sol com a peneira. Todo o trajeto é muito difícil. E nós estamos lá para vencer as dificuldades que a prova apresenta porque, para nós, participantes, esse talvez seja o maior desafio. Todas nós queremos terminar a prova e, com orgulho, dizer: "Eu completei a São Silvestre". Já são poucas as mulheres que têm coragem de se inscrever, correr e terminar a corrida de rua mais famosa e tradicional do Brasil. Precisamos agora lutar pela mudança desse horário das 15h, que transforma nosso prazer em dor e nosso sonho em pesadelo. Já tentei várias vezes liderar campanhas para alterar o horário da prova para as 17h, junto com a masculina. Não há sensibilidade nenhuma nesse sentido e acho que, se todas nós resolvermos correr no horário da prova masculina, vão acabar arranjando uma forma de administrar essa mudança. Quero correr, sim, porque tenho o direito de encontrar meus amigos na avenida Paulista e juntos comemorarmos o réveillon da forma mais saudável que existe: praticando esporte. Mesmo correndo às 17h, como fiz no último dia 31, já sentimos forte calor. Imagino o que sofreram minhas companheiras. Quem sabe não estaremos todas juntas dia 31 de dezembro e felizes com a mudança? Silene de Oliveira Silva Couto, 39, é atleta e participante da São Silvestre Texto Anterior: Torneio é mais jovem que NBA Próximo Texto: Perspectiva 97 Índice |
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