São Paulo, sexta-feira, 3 de janeiro de 1997 |
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Rush encarna excentrecidade do personagem
ADRIANE GRAU
Aos 45 anos e pai de dois filhos, o ator australiano Geoffrey Rush encarna com bom humor as mudanças em sua carreira por causa do sucesso do filme "Shine". A vontade para falar do pianista, ele gesticula com as delicadas mãos que excluíram a necessidade de um dublê para os detalhes no teclado durante o filme. (AG) Folha - Você se sentiu constrangido em interpretar um personagem real e ainda por cima vivo? Geoffrey Rush - Sim. Principalmente na cena final, quando ele faz o concerto da volta. Foi no segundo dia de filmagem. Pedi ao diretor para que os Gillian e David de verdade não estivessem lá. Era importante para mim saber que eu era o único David Helfgott na sala. Mas aí Gillian acabou se enfiando no meio dos extras, que eram o público assistindo ao concerto. Lynn Redgrave me contou que a viu chorando o tempo todo. Folha - Você se sentiu obrigado a representá-lo fielmente? Geoffrey Rush - Ele não é um personagem amplamente conhecido pelo público. Por causa disso, eu podia tê-lo representado como quisesse. Mas quis ser fiel a sua personalidade. Atuar para mim é um constante processo de redefinição de clichês. Folha - Você e ele chegaram a se conhecer bem? Geoffrey Rush - Me encontrei com ele antes de começarmos a filmar. Não quis que ele sentisse que estávamos desmontando sua personalidade para depois retratá-lo. Apenas passamos tempos juntos, tocando piano. Folha - Sendo que ambos sabiam que ele estava sendo observado, será que ele agiu naturalmente durante tais encontros? Geoffrey Rush - Bom... nunca quis dissecá-lo como se faz com uma borboleta. Achei que podia acabar matando a borboleta. Trabalhei mais com minhas intuições. É um homem que se torna muito concentrado e brilhante quando senta ao teclado. Ele continua gemendo, cantarolando e fungando enquanto toca. É muito excêntrico. Quando termina a performance, volta a falar em fragmentos, sem nexo. Tentei mostrar mais de seu comportamento ao invés de ficar tentando descobrir o que se passava em sua cabeça. Folha - Como é a sensação de deixar de lado os personagens clássicos de Gogol e Shakespeare que o consagraram para interpretar uma história real? Rush - "Shine" não me parece como algo a parte. Para mim já é um clássico, pois mostra a jornada de uma pessoa através de acontecimentos incríveis. Folha - É de se imaginar que sua experiência no teatro tenha sido fundamental. Rush - Nesse filme tive a oportunidade de desenvolver diálogos longos num personagem grandioso. O papel chegou na hora certa em que eu estava pronto. Folha - Você era fã de Helfgott antes de se envolver no projeto? Rush - Eu li o roteiro de "Shine" enquanto interpretava "Tio Vanya", de Checov, por sinal meu personagem preferido. Fiquei impressionado, mas nunca tinha ouvido falar dele. No mesmo fim de semana fui a Melborne e fui a um concerto. Quando o vi, o roteiro tomou vida na minha cabeça. Folha - Entre as propostas que você está recebendo após "Shine", há algo que lhe interesse? Rush - Nunca havia recebido tantos roteiros para ler. Mas eu tenho meu campo de trabalho na Austrália em companhias teatrais. Folha - Você considera David um homem louco? Rush - Gosto dos termos que ele usa para se referir a seus problemas. Ele diz que é o estrago, que esteve na névoa e que Gillian tornou tudo mais nítido. Texto Anterior: "Shine" explora jornada de pianista Próximo Texto: Filme mostra criatividade e loucura Índice |
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