São Paulo, sexta-feira, 3 de janeiro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ATRASO NA LEI

A multiplicação de problemas criminais e sanitários ligados ao consumo de drogas ilícitas no país torna mais premente rever a atual legislação sobre a matéria, que não acompanhou as acentuadas transformações das últimas décadas.
Na falta de atualização, seria desejável que as decisões da Justiça flexibilizassem ao máximo a interpretação da lei, em vista das graves questões envolvidas. Porém, ao que parece, não é o que vem ocorrendo com a apreciação legal dos programas de distribuição de seringas descartáveis a viciados, em troca das já utilizadas.
Com várias interdições judiciais, eles vêm sendo precariamente implementados em alguns pontos do país desde 89, com apoio da Organização Mundial de Saúde e financiados pelo Ministério da Saúde, para evitar que, ao compartilharem seringas, os usuários de drogas injetáveis sejam contaminados pelo HIV.
Claro que apenas a distribuição de seringas não é solução definitiva. Programas educativos são também necessários. Mas considerando a veloz propagação do vírus e a habitual promiscuidade do convívio entre viciados, torna-se altamente recomendável que o rigor legal seja abrandado por uma apreciação judicial mais atenta às questões de saúde pública, nas quais os magistrados não são especializados. Algumas equipes de agentes de saúde já estão inclusive desobedecendo a decisões legais recentes contrárias aos programas.
O espírito da lei atual e as decisões estritas tomadas a partir dela parecem ainda imbuídos da falsa percepção de que a origem do vício estaria nos próprios instrumentos que o alimentam, e não numa complexa somatória de fatores psíquicos e sociais que atuam sobre o indivíduo. Com isso, não se resolvem nem o problema do tráfico e consumo de drogas, nem o da disseminação do vírus que pode deflagrar a Aids.
A atualização é pois urgente, num momento em que grande parte do mundo caminha em direção contrária à da arcaica legislação brasileira.

Texto Anterior: PÉSSIMO EXEMPLO
Próximo Texto: Esquerda acorda tarde
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.