São Paulo, domingo, 5 de janeiro de 1997
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Hora do país real

OSIRIS LOPES FILHO

Há uma lei inovatória no mercado. A de nº 9.317, de 5 de dezembro de 96, que dá consequência ao determinado pelo art. 179 da Constituição.
Tal dispositivo obriga a União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios a estabelecerem tratamento diferenciado para as microempresas e as empresas de pequeno porte, em matéria administrativa, tributária, previdenciária e creditícia, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações.
A sua origem é espúria. Iniciou-se com a medida provisória nº 1.526/96, que, com algumas modificações, foi transformada em lei. Teve também finalidade abortiva. Em verdade, a MP objetivou travar a trajetória de dois projetos de lei, de autoria do senador José Sarney, que tratavam da matéria de uma maneira mais ampla e se revelavam vitoriosos, pois, já aprovados pelo Senado, estavam prestes a serem votados pela Câmara.
A nova lei é limitada. Trata apenas do aspecto tributário, não abordando as questões administrativas, previdenciárias e creditícias.
Mas constitui um progresso. Já anteriormente, em 1984 e 1994, foram feitas leis, pretendendo regular a matéria, que, de tão tímidas e travadas, não tiveram eficácia.
Sem pretender analisar, em detalhes, o seu conteúdo, é necessário frisar que ela encerra uma tentativa válida de a legislação tributária dirigir-se ao nosso país real.
O diploma legal básico do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica ainda é o decreto-lei nº 1.598/77, concebido para adaptar a legislação desse tributo à então nova Lei das S/As (nº 6.404/76).
Representa magnificamente uma alienação jurídica fantástica. Concebeu-se uma nova disciplinação do IRPJ, tendo por base uma organização societária complexa. Ora, a sociedade anônima não responde por mais de 3% do nosso PIB, e não emprega mais de 3% da força de trabalho ativa.
A esmagadora maioria das nossas empresas não tem estruturação de S/A. Essas não passam de 15 mil, em um universo que se estima de quatro milhões e meio de empresas, formais e informais.
Não tem sentido prático a fixação, por exemplo, dos "curricula" jurídicos das faculdades de direito de darem tanta importância às S/As, em detrimento das outras formas societárias.
Essa nova lei tributária das micro e pequenas empresas, apesar de suas insuficiências e restrições, encerra um compromisso com o Brasil real, que trabalha e produz, e que não pode ficar eternamente na marginalidade da lei.

Osiris de Azevedo Lopes Filho, 57, advogado, é professor da Universidade de Brasília e ex-secretário da Receita Federal.

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