São Paulo, domingo, 5 de janeiro de 1997
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A humanidade e o desarmamento

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

Aparentemente terminou a Guerra Fria! A sobra da chamada irresponsabilidade do poder é simplesmente lamentável. Entre outros armamentos, creio que bastaria citar mais de 50 mil ogivas nucleares, 70 mil toneladas de gás venenoso e 250 toneladas de plutônio!
Quanto a esse elemento criado em laboratório pelo homem, se por um acaso 150 kg das 250 toneladas fossem uniformemente distribuídos pelo planeta, estaríamos todos nós condenados à morte pela aparição rápida de tumores malignos de pulmão.
Por incrível que possa parecer, os americanos gastam cerca de US$ 250 bilhões para formar estoques de plutônio, matéria-prima principal na fabricação de bombas nucleares, e assim mesmo os EUA detêm apenas a metade da reserva de plutônio no mundo.
Pois bem. Eles terão de gastar outros US$ 250 bilhões ao longo dos próximos 50 anos para se livrar desses estoques.
O problema é complicadíssimo. O Congresso não teve nenhum problema para aprovar os primeiros US$ 250 bilhões para armar o país. O mesmo Congresso está relutando ao extremo para aprovar os US$ 250 bilhões para desmontar os estoques. E não é para menos. Desmontar é muito mais complicado do que montar.
Além do debate técnico há em torno dessa matéria uma grande descrença política. Muitos argumentam que desarmar é caro, perigoso e desnecessário. Afinal, essas armas poderão ser úteis no momento em que algum outro país se armar e ameaçar a paz mundial.
Para complicar as coisas, há o argumento segundo o qual desarmar é tão ilusório como querer "desinventar uma idéia". Uma vez inventada, a idéia permanece na cabeça de muita gente que, no caso em tela, pode transformá-la em mísseis.
A tecnologia para construir mísseis nucleares está disseminada na mente de muitos cientistas nos quatro cantos do mundo. Portanto destruir um estoque de plutônio não significa que ele não vá surgir em outro lugar.
Por fim, seria simplesmente quixotesco achar que os demais países que estão armados seguiriam os passos dos Estados Unidos num eventual programa de desarmamento. Em outras partes do mundo não há sequer recursos ou mesmo vontade para tal evento (Richard N. Haas, "It's Dangerous to Disarm", New York, 1996).
Esse mundo é mesmo irônico. Os homens sacrificam a saúde, a educação e o bem-estar para criar armamento. E, agora, por causa da necessidade de recursos para a saúde, educação e bem-estar não têm condições de se livrar do armamento. Quando é que o ser humano vai criar juízo?
Se por volta do século 13 o mundo temia os 100 mil cavalos do exército do bárbaro mongol Gengis Khan, o que mudou então? Parece que a tecnologia moderna trocou os animais por um telefone vermelho e meia dúzia de botões.
Só nos resta rezar para que as profecias de Nostradamus estejam furadas!

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