São Paulo, domingo, 19 de janeiro de 1997
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Para advogados, bancos não escaparão de conflitos

Instituições brigarão com o governo ou com os clientes

MILTON GAMEZ
DA REPORTAGEM LOCAL

Ou os bancos brigam com o governo na Justiça, ou com os próprios clientes. Eles só não irão é sair incólumes na questão da quebra do sigilo bancário pela prestação de contas à Receita Federal sobre a arrecadação da CPMF (Contribuição sobre Movimentação Financeira).
A opinião é de banqueiros e advogados de peso ouvidos pela Folha. Para o advogado Saulo Ramos, a lei que criou a CPMF fere o princípio constitucional da privacidade do cidadão, ou seja, quebra o sigilo bancário.
"Os clientes poderão entrar com ação penal contra os dirigentes dos bancos que cederem seus dados individuais à Receita e, além disso, mover ação civil para reparação de danos", diz Ramos.
Rogério Gandra Martins, que trabalha com o pai, o jurista Ives Gandra Martins, entende que a lei da CPMF colocou os bancos numa "sinuca de bico".
"A lei é inconstitucional quanto à questão do sigilo bancário. Ou os bancos a seguem à risca, ou serão multados. Só não haverá quebra de sigilo se a Receita abrir mão dos dados individuais de cada um ao normatizar a questão", diz Martins.
A assessoria de imprensa da Receita Federal diz que o assunto não foi resolvido. A tendência é seguir o que diz a lei, em normas adicionais a saírem nesta semana.
José Roberto Pisani, do escritório Pinheiro Neto, acha que os clientes poderão entrar com queixa-crime contra os bancos, pois a lei da CPMF fere o artigo 5º da Constituição federal.
"Somente uma Comissão Parlamentar de Inquérito ou um processo judicial pode quebrar o sigilo bancário das pessoas. A situação é igual à da época do IPMF, quando os bancos recusaram-se a entregar as informações individuais à Receita", afirma Pisani.
A Febraban (Federação Brasileira das Associações de Bancos) argumenta que, na época do IPMF, o que foi contestado na Justiça não foi a questão do sigilo bancário, e sim a competência da Receita para impor a entrega dos dados por meio de uma portaria (instrução para cumprimento da lei). Mas fora dos tribunais, o argumento era a preservação dos direitos constitucionais dos clientes.
"Agora temos uma lei que nos obriga a dar as informações completas, o que antes não acontecia", alega Maurício Schulman, presidente da Febraban.
Ele ressalva que a lei da CPMF estipula que os dados só poderão ser usados pela Receita para fins de arrecadação da CPMF, sem efeito para outras cobranças fiscais. O dispositivo está no 11º artigo da lei 9.311, que criou o imposto.
Martins duvida que isso possa ser cumprido. "Quem garante que um fiscal da Receita não vai autuar uma empresa ou pessoa física com base nos dados da CPMF?", indaga o advogado.
O assunto é espinhoso e não está resolvido. Três funcionários graduados de bancos falaram espontaneamente à Folha sobre as dúvidas dos bancos e, pouco depois das entrevistas, ligaram pedindo para ser mantidos no anonimato.

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