São Paulo, quarta-feira, 22 de janeiro de 1997
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PESOS E MEDIDAS

Como não poderia deixar de ser, a Justiça brasileira vive um natural processo dicotômico. Alguns juízes aplicam penas alternativas -num evidente e necessário esforço para a modernização do Direito penal e para a retomada do caráter reeducativo da sanção-, enquanto outros magistrados ainda aplicam a fria letra da lei, muitas vezes já incompatíveis com a evolução da sociedade.
Dois casos recentes envolvendo personagens notórios ilustram bem -talvez até caricaturalmente- esse estágio do Judiciário. De um lado, o estudante Fabrício José Klein, filho do ex-ministro dos Transportes Odacir Klein, foi condenado a doar cestas básicas e a não dirigir durante dois anos, além de pagar uma indenização ainda não definida à família do pedreiro que atropelou e matou.
Parece claro que, ao menos afastado do volante, Fabrício Klein não constitui uma ameaça à sociedade, sendo portanto injustificável colocá-lo em convívio com criminosos realmente perigosos. Muitos, porém, poderão considerar a pena demasiado leve, uma vez que seu ato resultou numa morte, e o estudante não parou para socorrer a vítima.
De outro lado está a condenação do ex-jogador de futebol Reinaldo José de Lima. A própria promotoria pediu sua absolvição, e o réu confessou ser dependente de cocaína. Mas lhe foi estabelecida a pena de quatro anos de prisão por tráfico de drogas, sem direito a apelação em liberdade. Note-se que sua participação limitou-se a emprestar um carro aos traficantes.
O ideal de uma Justiça una e inequívoca é apenas uma idéia reguladora. E, quanto mais poder discricionário se dá ao juiz, maiores são as chances de sentenças ganharem a aparência de injustas. Mas não se podem emitir opiniões definitivas sem o pleno conhecimento dos autos do processo.
Assim como a sociedade é multifacetada, também o são os magistrados. Essa constatação óbvia, tão óbvia como a de que o sistema prisional está falido, aponta para o caminho das penas alternativas, mantidos o equilíbrio e a proporcionalidade em relação ao mal realizado.
Uma Justiça independente e consoante com os sempre cambiáveis valores da sociedade é um dos fundamentos da própria civilização.

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