São Paulo, sexta-feira, 24 de janeiro de 1997
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Mohsen Makhmalbaf é vítima da beleza do Irã

MARCELO REZENDE
DA REPORTAGEM LOCAL

"Gabbeh", que estréia hoje em São Paulo, é uma espécie de drama em que não há lágrimas, e até mesmo a idéia de tristeza é diluída em cores, sorrisos em direção ao sol ou pequenos contos sobre as esperanças amorosas de uma jovem e seu pretendente.
"Gabbeh" é então mais um conto de Mohsen Makhmalbaf, o diretor pertencente a uma geração de cineastas iranianos que, há pelo menos cinco anos, causa surpresa nos festivais e circuitos da Europa.
O juízo sobre seu cinema -assim como em Abbas Kiarostami- parece oscilar sempre entre "genial" (o adjetivo que chega quase sempre da França) e "tedioso", uma constante na crítica inglesa.
O Irã, para a cultura ocidental, parece estar acenando com o anticinema, um objeto que se opõe ao tempo, tema ou razão dos filmes que estamos acostumados a ver.
A sensibilidade é então outra. No lugar de uma certa ação frenética, a placidez. Para se opor ao romantismo que só se realiza no sexo, o amor contido, muitas vezes até distante. Um cinema, literalmente, do outro mundo.
"Gabbeh" é um raro tapete de uma tribo nômade. E é também o nome de uma mulher que não pode se casar porque deve seguir as regras de seu povo. Outros de sua família devem construir uma família antes dela.
Seu consolo é poder contar a infelicidade por meio do bordado. A história sobreviverá a ela por meio das figuras e dos tons de azul. Algo que Makhmalbaf parece deixar claro ao nos fazer acompanhar a narrativa pela fala de um casal idoso, proprietário do velho tapete.
Mas talvez o que mais interesse nesse tal "movimento iraniano" não seja a semelhança, e sim as particularidades de cada um.
Makhmalbaf não habita apenas um país e suas tradições. O que parece desejar é a resposta para um mistério que o incomoda e está no centro de suas preocupações.
Tudo o que seus olhos alcançam ou seu coração sente é uma invenção, uma natureza que se estabelece por seu desejo, criando, assim, universo de possibilidades.
Essa visão (tão magistralmente trabalhado em "Um Instante de Inocência", exibido na última Mostra Internacional), em "Gabbeh", não se resolve. Está, estranhamente, obscurecido pela qualidade de suas lindas imagens.
Makhmalbaf, assim como todo amante de poesia -e "Gabbeh" é seu poema-, corre sempre o risco de se perder na beleza de um verso.

Filme: Gabbeh
Direção: Mohsen Makhmalbaf
Produção: Irã, 1996
Com: Abbas Sayaki, Hossein Moharami
Cinema: Espaço Unibanco 1

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